Nanotecnologia e alimentos
Décio Luiz Gazzoni

O caminho dos alimentos do campo à mesa está se sofisticando cada vez mais. As inovações tecnológicas permeiam, progressivamente, o processamento dos alimentos. Conforme a discussão sobre biotecnologia vai parecendo coisa da era jurássica, a nanotecnologia vai assumindo um papel de protagonista.

Antes de prosseguir, o que é mesmo nanotecnologia? É a tecnologia que lida com estruturas atômicas da ordem do bilionésimo de metro. Na chamada "escala nano", as partículas de determinada substância ou tem suas propriedades originais fortemente acentuadas, ou ganham novas propriedades, inexistentes na escala a que estamos acostumados. Estas propriedades podem ser úteis para modificar sabor, textura ou melhorar a qualidade dos alimentos.

 

Nutrição e saúde

Imaginemos duas doenças crônicas comuns: diabetes e hipertensão. O diabético tem restrições no consumo de açúcares, e o hipertenso no consumo de sal, tornando a vida destas pessoas literalmente "sem sal e sem açúcar", pois a retiradas destas substâncias modifica drasticamente o sabor e a consistência dos alimentos.

Mas, sob a égide da nanotecnologia, é preciso colocar o verbo no passado: tornavam! Uma das características da nanotecnologia é trocar ingredientes sem alterar o sabor de forma perceptível.

 

 

Por esta razão está sendo cunhada a expressão nanonutrientes, para definir as novas substâncias que passam a fazer parte da composição dos alimentos. Novos sabores, aromas e odores, tornados possíveis pela nanotecnologia, produzem nos órgãos sensoriais (papilas gustativas ou células olfativas) o mesmo efeito dos condimentos tradicionais. Portanto, com o uso de técnicas nanotecnológicas, é possível reduzir os teores de sal ou de açúcar dos alimentos, sem, no entanto, alterar as demais propriedades, em especial o sabor. Desta forma, os alimentos mantêm seu poder nutritivo e demais características que tornam a alimentação prazerosa, eliminando os fatores de risco à saúde, melhorando a qualidade de vida do cidadão.

 

A nanotecnologia está presente na engenharia de materiais, na física, na eletrônica, na medicina e, particularmente, na indústria de cosméticos, onde tem apresentado um avanço espetacular. Agora é a vez indústria de alimentos, que está mergulhando de cabeça na nanotecnologia. Por exemplo, é possível aumentar a durabilidade dos alimentos, com técnicas nanotecnológicas, criando "nanoembalagens", que protegem o alimento de ameaças externas – microrganismos, por exemplo. Também é possível incrementar o teor de nutrientes, como vitaminas ou sais minerais, melhorar a aparência dos alimentos, a textura ou outra propriedade plástica, nutricional ou a sua inocuidade.   O principal impulso para o rápido crescimento da nanotecnologia provém das exigências cada vez maiores, tanto dos consumidores quanto das autoridades reguladoras, em relação à qualidade dos alimentos. Os consumidores estão cada vez mais atentos às informações nutricionais dos rótulos dos produtos. Se for hipertenso, vai procurar no rótulo a indicação do teor de sódio. Se diabético, o teor de açúcar. Porém, a preferência sempre recairá sobre produtos que atendam a necessidade médica do consumidor, sem perder as qualidades organolépticas. Da mesma forma, as autoridades reguladoras e fiscalizadoras tornam-se cada vez mais exigentes em relação à qualidade, à inocuidade e às restrições nutricionais para determinados grupos de consumidores (hipertensos, diabéticos, cilíacos, etc.), gerando restrições que são mais facilmente superadas pela nanotecnologia.

 

Novos negócios

Novos tempos geram novas oportunidades. Empresas foram criadas para pesquisar, produzir e comercializar produtos nanotecnológicos, em especial os que atuam nos órgãos sensoriais. Uma destas empresas é a Firmenich (http://www.firmenich.com), outra é a Givaudan (http://www.givaudan.com.br), ambas suíças, que desenvolveram aromas e fragrâncias, que podem ser incorporados a alimentos e cosméticos. A Gevaudan também desenvolveu receptores eletrônicos similares às células da língua para testar os novos aromas. A Embrapa desenvolveu a "língua eletrônica" que também permite efetuar muitos testes, antes possíveis apenas com as papilas gustativas humanas. Assim, a nanotecnologia, como já ocorre com a biotecnologia, cria novas oportunidades, permitindo a horizontalização do mercado, com grandes vantagens para a indústria e para os consumidores.   Outra linha de negócios está associada aos consumidores que possuem alergia específica a um componente, ou genérica (como a rinite alérgica ou urticária). Neste caso, há necessidade de substituir corantes e outras substâncias que deflagram alergias alimentares. Em outra linha, a nanotecnologia está sendo utilizada para transformar o betacaroteno, nutriente que funciona como corante em sucos e manteigas e que tem ação contra o envelhecimento precoce das células. Na nanoescala, aumenta a eficiência das substâncias como corantes e melhora sua absorção pelo corpo. Aqui no Brasil, a Nanox, de São Carlos, desenvolveu nanoembalagens, para proteger os alimentos de bactérias que causam a deterioração. Por exemplo, frutas imersas em uma solução contendo nanopartículas do milho e de quitosana, são revestida por uma nanopelícula protetora que dobra sua vida útil. Em outras palavras, bem vindo ao nanofuturo, onde os alimentos serão cada vez mais saudáveis, nutritivos e saborosos.

Desmatamento evitado
Décio Luiz Gazzoni

REDD é a sigla para Redução de Emissões por Desmatamento e Degradação. Dito de outra forma significa que, em troca de um pagamento, os países que dispõem de grandes extensões de florestas nativas se comprometem a preservá-las. A lógica está na imobilização do estoque de carbono existente nas árvores das florestas, evitando que, através do desmatamento, este carbono seja emitido para a atmosfera. Como sabemos, a Ciência demonstrou que as Mudanças Climáticas Globais estão diretamente associadas ao aumento da concentração de gases de efeito estufa (GEE) na atmosfera, principalmente o gás carbônico. Uma das vias de aumento da concentração de GEE é a derrubada das florestas e, em especial, as queimadas decorrentes da derrubada. Por sinal, no Brasil, a maior fonte de emissão de GEE (55%) deriva das queimadas, seja em florestas ou em áreas de pastagens.   O REDD entra nesta história pois significaria um mecanismo financeiro – portanto, com grande apelo econômico para a sociedade e para os governantes – de preservação da floresta, derrubando argumentos como as dificuldades orçamentárias para sua preservação, os incentivos para o desenvolvimento de atividades sustentáveis, ligadas à floresta em particular, ou à agropecuária em geral, e mesmo as barreiras ao desenvolvimento de um país ou de uma região. Isto justifica o interesse dos governos dos diferentes países que dispõem de florestas por preservar.

Brasil

A proposta é particularmente interessante para o Brasil, que dispõe da maior área de floresta intacta do mundo e que se vê às voltas com sérios problemas para zerar o desmatamento e para reduzir as emissões por queimadas. A posição geral dentro do Governo é ser favorável à matéria, embora ainda existam bolsões que discutem a sua exequibilidade e as suas externalidades. Particularmente, o conjunto de Governadores da Amazônia Legal não apenas é favorável como possui uma posição proativa a fim de que o Brasil apóie a aprovação do mecanismo de REDD nos acordos internacionais de Mudanças Climáticas.

  Os valores envolvidos são muito altos, embora difíceis de dimensionar com precisão, pois o mecanismo de REDD ainda não tem seu conceito solidificado e sequer existe no mercado como tal. Entretanto, pode-se inferir sua dimensão pela proposta de "REDD voluntário" que os Governos do Brasil e da Noruega firmaram, para criar o Fundo Amazônia, e que envolve US$1 bilhão. Estima-se que, apenas do aporte americano, os valores envolvidos alcançariam entre US$20-30 bilhões/ano. No limite, existem estimativas que apontam para valores anuais superiores a US$150 bilhões, que seriam repassados aos Governos dos países dispostos a preservar as suas florestas.

O contexto

Se os acordos internacionais estabelecerem um teto para as concentrações de CO2, visando limitar o incremento de temperatura, até o final do século abaixo de 2ºC, é fundamental investir na redução do desmatamento. Para atingir a meta, os cientistas que compõem o IPCC, o fórum científico da ONU para o estudo de Mudanças Climáticas, informa que a concentração de CO2 na atmosfera não poderá ultrapassar 450 ppm (partes por milhão). Porém, lamento informar que, em 2009, já ultrapassamos o limite de 400 ppm, mostrando a urgência das ações.

  O grupo de 35 países que detém a quase totalidade das florestas do planeta é o maior interessado na implementação do REDD. Entretanto, é importante ter em mente que não se salvará o clima do planeta só com preservação de florestas. Sem dúvida, preservar a floresta é muito importante, entretanto isto não pode servir de argumento para países industrializados pagarem exclusivamente para conservar a floresta, sem fazer a lição de casa, que é reduzir as suas emissões. A agenda é mais ampla e complexa e o mecanismo de REDD é mais uma linha auxiliar, para evitar que a situação piore. Entretanto, para que possamos, no médio e longo prazo, diminuir as emissões de GEE, outras ações terão que ser implementadas. Em especial, o mundo terá que mudar, rapidamente, a sua matriz energética, com participação cada vez maior de energia renovável.

Oportunidade

Entre os países com grande cobertura florestal, o Brasil é o que reúne melhores condições tecnológicas e de governança para assumir o compromisso de zerar o desmatamento, no longo prazo, no bojo de fortes reduções anuais da derrubada da floresta. O REDD é um dos poucos mecanismos de incentivo que pode viabilizar a transição da lógica econômica vigente - em que se ganha derrubando - para aquela em que se ganha mantendo a floresta em pé, com crescimento econômico. Por esta lógica incentiva-se o desenvolvimento sustentável, inibindo o desmatamento e reduzindo a necessidade de medidas punitivas.   Segundo os cálculos do IPAM, há 47 bilhões de toneladas de carbono estocado nas florestas remanescentes da Amazônia brasileira e 30% do total encontra-se em terras indígenas. O desafio é evitar a grilagem de terras públicas ou indígenas, promovendo alternativas econômicas que impliquem em crescimento sustentável, em linha com a tese de mitigar o impacto deletério das Mudanças Climáticas Globais sobre a vida na Terra. É onde o mecanismo do REDD pode fazer toda a diferença.

 

Segunda geração de biocombustíveis
Décio Luiz Gazzoni

 

Para introduzir o artigo, apresento os conceitos que adoto para as gerações de biocombustíveis.

1ª. Geração: É a geração atual, composta, principalmente pelo etanol, biodiesel e biogás (proveniente de biodigestores);

2ª. Geração: São biocombustíveis obtidos por novas técnicas de processamento, a partir de matéria prima já existente. O exemplo mais conhecido é o etanol celulósico;

3ª. Geração: Serão obtidos biocombustíveis através de novas técnicas de processamento, resultantes de aprimoramentos da 2ª. geração, porém sua grande marca será a utilização de matérias primas específicas. Um bom exemplo são os biocombustíveis a serem obtidos de microalgas melhoradas para obtenção de energia;

4ª. Geração: Plasma os dois conceitos anteriores (métodos revolucionários e matérias primas mais eficientes) com otimização do balanço energético, integração de processos, conjugados com captura e estocagem do gás carbônico resultante do processo de obtenção de biocombustíveis.

 

 

O etanol de primeira geração pode ser obtido pela conversão de materiais renováveis, através de processo fermentativo, usando cepas melhoradas por processos clássicos, derivadas de microrganismos encontrados na natureza. À exceção da cana de açúcar, restrições são apostas a outras matérias primas (produto caro, compete com produção de alimentos, baixa eficiência energética, alto fluxo de carbono, etc.). Os resíduos agrícolas poderiam solucionar estes problemas, pois são em grande parte compostos de celulose, o principal componente da parede celular vegetal.   Entretanto, a celulose é muito mais difícil de degradar a açúcares simples do que o amido. Enquanto a fermentação que decompõe o amido só precisa de uma enzima, a degradação da celulose requer um conjunto de enzimas, trabalhando harmonicamente. E, para cada matéria prima, com arranjo celulósico diferente, são necessárias enzimas e condições de reação específicas.   As enzimas degradadoras de celulose são as celulases. As enzimas utilizados na indústria - isoladas de várias espécies de fungos filamentosos encontrados em vegetais em decomposição - são lentas e instáveis e, como resultado, o processo é proibitivamente caro.

Biotecnologia

Pesquisadores da Caltech (Califórnia Institute of Technology) construíram 15 catalisadores enzimáticos, que quebraram eficientemente a celulose em açúcares, em ambiente de altas temperaturas. O material genético foi sintetizado em Saccharomyces cerevisae, a partir de genes obtidos dos fungos Humicola insolens, H. jecorina e Chaetomium thermophilum. A inovação está no fato de que as enzimas construídas possuem uma notável estabilidade térmica, e demonstraram a capacidade de degradar celulose atuando em um variado leque de condições ambientais e de matéria prima.

As novas enzimas foram criadas usando um programa de computador para design genético, que determina exatamente onde os genes devem recombinar, para obter a maior chance de sucesso. No caso, os pesquisadores buscavam enzimas que pudessem atuar a temperaturas muito superiores à máxima suportada pelas atuais celulases industriais.

Os cientistas do Caltech "acasalaram" as sequências de três celulases fúngicas já conhecidas e eficientes, obtendo mais de 6.000 grupos de progênies, que eram diferentes de qualquer um dos parentais, embora as proteínas codificadas na enzima possuam a mesma estrutura, e mantenham a capacidade de degradação de celulose.

 

Pesquisas da empresa privada DNA2.0 identificaram os princípios de design genético que permite maximizar a expressão de proteínas. Ao analisar as enzimas, com o apoio de um software específico, os cientistas do Caltech e da DNA2.0 previram quais das mais de 6.000 novas enzimas seria as mais estáveis, sob temperaturas mais elevadas. A termoestabilidade é uma exigência de celulases eficientes, pois em temperaturas mais altas - digamos, 70 ou 80º.C - as reações químicas são mais rápidas. Além disso, a celulose "incha" em altas temperaturas, facilitando a quebra da sua cadeia, por ataque enzimático. Infelizmente, as celulases encontradas na natureza são inativadas a temperaturas superiores a 50º.C.

Há mais vantagens na inovação. As enzimas que são altamente termoestáveis também tendem a se manter ativas por um longo tempo. Enzimas mais duradouras quebram mais celulose, reduzindo a necessidade de reposição, logo seus custos são mais baixos.

A sequência desenhada pelo computador foi sintetizada em DNA real, as quais foram transferidas para o fermento Saccharomyces cerevisae, responsável pela transformação de açúcares em etanol. A levedura transgênica produziu as enzimas, que foram então testadas para avaliar a sua capacidade e eficiência para degradar celulose. Todas as 15 novas celulases obtidas por biologia sintética foram mais estáveis, operaram em temperaturas significativamente mais elevada (70 a 75º.C), e degradaram mais celulose por unidade de tempo e de enzima, do que as enzimas parentais.

Este trabalho demonstrou o que é possível fazer através da biologia sintética. Sem necessitar recorrer a qualquer organismo vivo – sequer os fungos que doaram as sequências genéticas – foi possível resolver uma série de problemas que vinham se constituindo em barreiras ao avanço dos processos de obtenção do etanol celulósico, de forma competitiva.

 

Agregação de valor no agronegócio
Décio Luiz Gazzoni

Desde o inicio de minha vida profissional ouço o leitmotiv da necessidade de agregação de valor ao nosso produto agrícola. Neste exato momento, a sociedade brasileira discute o fenômeno da desindustrialização de diversos setores da economia brasileira, flagrada pela relação crescente entre o valor da exportação de matérias primas e de produtos industrializados. O agronegócio toma outro rumo: de renitente exportador de matéria prima, paulatinamente o Brasil trilha a senda de agregação de valor, cujo exemplo mais completo está na cadeia de aves, pois exportamos porções temperadas e pré cozidas de frangos abatidos voltados para Meca, ou seguindo os preceitos Kosher. No entanto, não necessariamente precisamos de processos industriais caros e complexos para agregar valor ao produto agrícola.  

Existem outros exemplos recentes de como processos tecnológicos inovadores geram produtos de alto valor agregado, conquistando novos mercados, elevando as margens e reduzindo a dependência da balança comercial em relação a commodities. Na última edição da feira alemã Anuga – o maior evento global na área de alimentos e bebidas - empresas brasileiras lançaram novos produtos para garantir o avanço em nichos específicos de mercado. A indústrias de massas J. Macêdo lançou a farinha de trigo embalada a vácuo, cativando os importadores pelo maior prazo de validade, por reduzir em 30% o espaço nos caminhões, eliminando avarias das embalagens de papel e, portanto, evitando contaminações. A inovação reduz custos e eleva as margens em até 40%. A empresa usou o novo produto, junto com a gelatina e as misturas de bolo sem adição de açúcar, para deflagrar a meta de garantir 12% de seu faturamento com as vendas no exterior até 2020.

 Nichos

Até pouco tempo com consumo limitado à América do Sul, a erva-mate já é exportada como extrato concentrado para substituir aditivos químicos em bebidas energéticas tipo Red Bull ou Flying Horse. Empresas dos EUA, Suíça e Noruega compram a erva brasileira para conferir apelo saudável a seus produtos. O produto também é vendido como antioxidante e como aromatizante de pães, arroz e sorvetes na Coréia. Em busca de agregação de valor com processos inovadores, a Café Bom Dia conseguiu associar sua marca ao apelo sustentável e orgânico. Com um produto tipo "especial" certificado - nicho onde os preços triplicam - a empresa fez um documentário para mostrar o processo de produção, casando conceitos e transferindo atributos, aproveitando uma singular oportunidade de posicionamento mercadológico. Na mesma linha, a empresa salienta que seu café especial é o primeiro com carbono neutro. No eixo desta estratégia de incorporação de valores que são atrativos para consumidores informados e exigentes, a empresa exporta para 22 países da Ásia, Mercosul e Estados Unidos.

 

Por vezes a agregação de valor é um detalhe intuitivo, não percebido pela concorrência. A Brasfrigo, líder nacional em conservas de milho e ervilha, lançou na feira da Alemanha uma nova embalagem. Seu diferencial: não requer tesoura para cortar. Um produto feito sob medida para mercados mais exigentes, que buscam praticidade. Apesar de parecer uma inovação simples, o fato é que nenhum concorrente havia lançado um produto similar, o que ensejou múltiplos negócios à Brasfrigo, durante a Anuga.

Criatividade

Para abrir novos mercados, o Laticínios Tirolez buscou a diferenciação oferecendo um tipo de queijo embalado à vácuo, em pequenas latas. O principal atrativo do produto é a dispensa de refrigeração. Este é um mercado exigente, porém remunerador, A previsão é que a empresa, que exportará US$ 5 milhões neste ano, também ofereça a ricota cremosa ao mercado gourmet e o requeijão para o segmento "food service" e como ingrediente para indústrias alimentícias dos EUA, África e Oriente Médio. Com esta estratégia inovadora, a empresa garante sua presença nestes nichos nobres do mercado

 

  O que parece ser um mercado pequeno e restrito pode descortinar boas oportunidades para empresários que atuem criativamente na agregação de valor. A Ruette Spices, terceira maior exportadora mundial de pimenta e especiarias, alcançou seu 100º mercado com um processo inovador que descarta o uso de álcool industrial no tratamento da pimenta. Um secador rotativo elimina, pelo calor, o risco de mofo e reduz a umidade a 8%. E rende um adicional de US$ 100 por tonelada pela inovação - a tonelada de pimenta vale hoje US$ 2,9 mil no mercado internacional. Porém a empresa não vai ficar "deitada eternamente no berço esplêndido" deste avanço e investirá US$ 1 milhão para comprar uma fábrica de esterilização a vapor, que permitirá um adicional de US$ 400 por tonelada do produto exportado.  

O último exemplo vem do mel. Em busca de valor agregado, o apiário Lambertucci, de Rio Claro (SP), criou o pólen de mel desidratado para ser usado como cereal no café da manhã. O apelo mercadológico é a tonificação da pele, cabelo e músculos. O produto tem forte demanda nos EUA, Europa, Oriente Médio e Japão. O pólen é rico em fibras, proteínas e aminoácidos essenciais.

A agregação de valor não beneficia exclusivamente o empresário industrial. Com a incorporação de tecnologias mais sofisticadas para agregação de valor, o preço mais elevado abre mercados mais remuneradores, porém mais exigentes. Logo, as exigências serão transferidas para a matéria prima, abrindo mercados para nichos (orgânicos, carbono neutro, alimentos funcionais), com crescentes requisitos de qualidade certificada, o que significa maior remuneração para a matéria prima da indústria.

 

Produtividade de soja
Décio Luiz Gazzoni

A História da Humanidade confunde-se com o avanço da produtividade da agricultura. Atualmente, são necessários 0,22 ha para alimentar cada uma dos 6,7 bilhões de cidadãos do mundo, redundando em 1,5 milhões de ha de terras cultivadas. Nas áreas de mais alta tecnologia alimenta-se uma pessoa com 0,1 ha. Países da Europa, EUA e Japão detêm os maiores índices de produtividade agrícola do mundo, pela conjunção entre alta tecnologia e políticas públicas de suporte ao agricultor e ao agronegócio.   No Brasil, entre 1977 e 2010, a produtividade das culturas de grãos cresceu a uma taxa geométrica de 3,3% a.a. Entretanto, houve dois momentos diferenciados, pois, entre 1977 e 1990, o crescimento foi de 1,1%, enquanto entre 1990 e 2007 a produtividade se expandiu a 4,1% a.a. Para as duas principais culturas de grãos, entre 1970 e 2007 a produtividade de soja cresceu 2,3% a.a. e a de milho 2,4% a.a. Assim mesmo, exceção feita à soja, a produtividade dos principais produtos da agropecuária brasileira situa-se bem abaixo dos líderes de cada produto.

O futuro

Projetando-se o longo prazo (2050), estima-se que haverá necessidade de expandir a produção mundial de alimentos em 60% porém, dificilmente, será possível incorporar, especificamente para produção de alimentos, mais de 20% da área atual (cerca de 300 Mha), pois também haverá pressão para aumento da produção de outros produtos agrícolas. Logo, haverá necessidade de ganhos de produtividade superiores a 33%, exigindo ações imediatas para evitar as conseqüências alternativas, que seriam a oferta de alimentos inferior à demanda ou os impactos ambientais indesejáveis do avanço da fronteira agrícola.   O Brasil, pelas suas vantagens comparativas e pela expectativa de que venha a ser o grande provedor de alimentos do mundo, deverá elevar sua produtividade muito acima de 33%, para compensar ganhos menores em áreas onde a produtividade já é muito alta ou onde esse incremento será menor. Pelo retrospecto recente, e pelo diferencial entre a produtividade atual da agropecuária brasileira, e aquela atingida pelos países líderes, é factível um incremento da produtividade de 3,4% ao ano, entre 2010 e 2022.

 

Produtividade nos EUA

Fica difícil crer que, em 2008, um sojicultor produziu 131 sacos de soja por hectare (7.868kg/ha) e ficou decepcionado. E qual a razão? Ocorre que, em 2007, o mesmo agricultor havia produzido 10.403 kg/ha. Estou falando de Kip Cullers, o recordista mundial de produção de soja. O segredo dele? Ele mesmo diz que não há um segredo em especial. Ele segue apenas duas regras. Primeira regra: procura utilizar as recomendações tecnológicas para produção de soja. Segunda regra: Conduz sua lavoura com o máximo de capricho e executa cada operação com extremo cuidado e zelo. E o leitor pode perguntar: quanto custou cada quilo de soja dos 10.403 kg/ha? Até pode ter sido caro, mas o detalhe não interessa ao Kip Cullers. Porque ele busca a máxima produtividade em um talhão menor, de alguns poucos hectares, que servem como um laboratório ao ar livre. As tecnologias que propiciam alta produtividade e, concomitantemente, aumentam a rentabilidade, são utilizadas no restante da lavoura de soja. Assim, o recordista mundial de produtividade de soja consegue também ser um recordista de rentabilidade.

 

 

Produtividade no Brasil

Em agosto de 2010 o CESB (Comitê Estratégico Soja Brasil) entregou as distinções aos produtores de soja que obtiveram as produtividades de soja mais elevadas no Brasil, na safra 2009/2010. Na safra anterior, a primeira edição do Desafio Nacional de Máxima Produtividade de Soja havia destacado produtores de soja, com médias de produtividade acima de 4.800 kg/ha. Estes números já eram entusiasmantes, afinal o recordista daquela edição (Guilherme Ohl, de Primavera do Leste) produziu 89% acima da média brasileira daquela safra: 4.968 kg/ha.   Em 2010 a média brasileira foi 11% superior à do ano anterior. Mesmo assim, os vencedores do Desafio de Produtividade obtiveram índices ainda superiores aos verificados no ano anterior. O vencedor, Leandro Sartorelli Ricci obteve a produtividade de 6.501 kg/ha, ou 123% acima da média brasileira desta safra. Dos 20 produtores premiados, nas quatro grandes regiões produtoras do Brasil, apenas três apresentaram produtividade entre 4.500 e 4.800 kg/ha. Os 17 restantes produziram acima de 4.800 kg/ha.   Considerando a enorme demanda por soja, nos próximos anos, ao Brasil se impõe a necessidade de avanços crescentes de produtividade. A pergunta que faz a diferença é: Se o Leandro conseguiu produzir 6.501 kg/ha, usando apenas e tão somente a tecnologia disponível comercialmente, por que eu também não conseguiria? Se você está se fazendo esta pergunta, então é hora de acessar o site do CESB (www.cesbrasil.org.br) e participar do desafio da safra 2010/11. Quem sabe, daqui a um ano, não estarei comentando o seu recorde?

Novos biocombustíveis: ficção científica?
Décio Luiz Gazzoni

 

Em primeiro lugar, os conceitos de gerações de biocombustíveis:

1ª. Geração: É a geração atual, composta, principalmente pelo etanol, biodiesel e biogás (proveniente de biodigestores);

2ª. Geração: São biocombustíveis obtidos por novas técnicas de processamento, a partir de matéria prima já existente. O exemplo mais conhecido é o etanol celulósico;

3ª. Geração: Serão obtidos biocombustíveis através de novas técnicas de processamento, resultantes de aprimoramentos da 2ª. geração, porém sua grande marca será a utilização de matérias primas específicas. Um bom exemplo são os biocombustíveis a serem obtidos de microalgas melhoradas para obtenção de energia;

4ª. Geração: Plasma a 2ª. e a 3ª. geração, com otimização do balanço energético, integração de processos, conjugados com captura e estocagem do gás carbônico resultante do processo de obtenção de biocombustíveis.

 
O etanol de primeira geração resulta da fermentação de sacarídios de baixo peso molecular, usando cepas melhoradas de microrganismos encontrados na natureza. Exceção feita à cana de açúcar, restrições são apostas ao etanol obtido de outras matérias primas (produto caro, compete com produção de alimentos, baixa eficiência energética, alto fluxo de carbono, etc.). Entretanto, os resíduos agrícolas, compostos de celulose, poderiam solucionar estes problemas.   Porém, a celulose é muito mais difícil de degradar a açúcares simples, fermentáveis, do que o amido. Além disso, enquanto a fermentação do amido de milho só precisa de uma enzima, a degradação da celulose requer uma série de enzimas, trabalhando em conjunto. Adicionalmente, para cada matéria prima, com arranjo celulósico diferente, são necessárias enzimas diferentes e condições de reação específicas.

Avanços da 2ª. geração

Pesquisa conduzida no Califórnia Institute of Technology permitiu obter 15 catalisadores enzimáticos, altamente termoestáveis, que desconstruíram eficientemente a celulose a açúcares, sob altas temperaturas. O material genético foi sintetizado em Saccharomyces cerevisae, a partir de genes obtidos dos fungos Humicola insolens, H. jecorina e Chaetomium thermophilum. A inovação está na notável estabilidade térmica, permitindo degradar celulose em um variado leque de condições, tanto de ambiente quanto de matéria prima.

A termoestabilidade é uma característica de celulases eficientes, pois em temperaturas mais altas - entre 70 e 80º. C - as reações químicas são mais rápidas. Como a celulose "incha" em altas temperaturas, é mais fácil quebrar a sua cadeia, por ataque enzimático. As celulases naturais são inativadas acima de 50º. C. As enzimas altamente termoestáveis também duram por um longo tempo, mesmo em temperaturas baixas. Enzimas mais duradouras quebram mais celulose, reduzindo a necessidade de reposição, logo seus custos são mais baixos.

 

A seqüência genética das enzimas foi desenhada pelo computador e sintetizada em laboratório. Posteriormente, foram transferidas para o fermento Saccharomyces cerevisae, que transforma os açúcares em etanol. A levedura transgênica produziu as novas enzimas, que comprovaram a sua capacidade e sua eficiência para degradar celulose.

Este trabalho demonstrou o que é possível fazer através da biologia sintética. Sem recorrer a qualquer organismo vivo – sequer os fungos que tiveram as sequências genéticas copiadas – foi possível resolver uma série de problemas que vinham se constituindo em barreiras ao avanço dos processos de obtenção do etanol celulósico, de forma competitiva.

Avanços da 3ª. geração

Uma nova variedade de milho (Spartan Corn), desenvolvida por cientistas do Michigan State University, torna as folhas e caules de milho em produtos tão valiosos como os grãos. A inovação está no seu genoma, que incorporou enzimas celulases na planta de milho. Esta variedade é o exemplo concreto do conceito de 3ª. geração de biocombustíveis, ou seja, matéria prima inovadora, que soluciona problemas tecnológicos industriais, questões ambientais e econômicas.

Como o milho transgênico da MSU já contém as enzimas necessárias para degradação da celulose, após a colheita da biomassa (ou seja, a planta inteira), as celulases degradam o material celulósico a monossacarídeos, que são fermentados a etanol ou outro biocombustível mais avançado. Obviamente, estudos serão necessários para definir quanta biomassa será possível exportar e quanta deverá permanecer no campo, para reciclagem de nutrientes e para manutenção do teor de matéria orgânica do solo.

 

Outros exemplos da terceira geração de biocombustíveis são árvores cujo teor e estrutura de lignina foi artificialmente enfraquecida e reduzida, que se desintegra facilmente através de técnicas já dominadas industrialmente. Plantas com baixo teor de lignina estão sendo desenvolvidas por vários institutos de pesquisa, entre eles o laboratório do pai da engenharia genética de plantas, Marc van Montagu, da Universidade de Ghent, na Bélgica, que trabalha com o gênero Populus.

Ainda existem problemas tecnológicos a serem superados. Porém, as inovações que brotam a todo o instante dos laboratórios de pesquisa e, principalmente, os avanços alentadores que se observam na fase pré-industrial, ou no lançamento de novas variedades, reforçam minha tese de que, até o final desta década, assistiremos a uma verdadeira revolução na indústria de biocombustíveis, com um forte impacto mercadológico no agronegócio e no estilo de vida da sociedade.

 

Moratória da soja
Décio Luiz Gazzoni

Em 2006 foi criada a Moratória da Soja, com a ambição de eliminar o desmatamento da Floresta Amazônica vinculado ao cultivo de soja. Trata-se de uma iniciativa perfeitamente adaptada aos novos tempos, em que a agenda ambiental imiscui-se com a agenda comercial, a ponto de que esta última enfrenta sérios percalços se não atender a primeira. O mercado internacional, em especial os mercados localizados em países ricos, pressionam os exportadores para assegurar que a soja (ou seus produtos) não foi produzida à custa da agressão ao meio ambiente, sendo o desmatamento na Amazônia um tema particularmente sensível no mercado.   Embora as estatísticas disponíveis indicassem que o plantio de soja no bioma Amazônia pouco representava para o total da produção desta oleaginosa no Brasil, o fato de que nosso país se impõe cada vez mais como um player de primeira linha no mercado internacional, nos obriga a agir como a mulher de César: não basta ser honesta, é preciso parecer honesta. Esta é a razão principal da Moratória da Soja: comprovar, acima de qualquer dúvida razoável, que os produtores de soja estão respeitando a legislação ambiental vigente, o zoneamento agroecológico da soja e que estão em linha com os anseios do mercado e dos consumidores.

 

Metodologia

A moratória da soja teve como inspiradores a ABIOVE (Associação Brasileira das Indústrias de Óleos Vegetais) e a ANEC (Associação Nacional dos Exportadores de Cereais). Seu objetivo é identificar a ocorrência de plantio de soja no bioma Amazônia, em áreas nas quais a mata nativa tenha sido derrubada após 24 de julho de 2006 – data da entrada em vigor da Moratória. Para tanto são utilizadas imagens de satélite para selecionar áreas de desmatamento identificadas pelo projeto PRODES (Monitoramento da Floresta Amazônica Brasileira por Satélite), com provável presença de plantio de soja. As informações de uso e ocupação da terra são confirmadas por sobrevôo e por levantamento de campo. Uma vez identificado o plantio de soja em área desmatada, a soja obtida na propriedade não é aceita para comercialização pelos associados da ABIOVE e da ANEC, tendo seu mercado fortemente restringido.   O processo de levantamento é repetido anualmente, para garantir o cumprimento do objetivo. Entre 2009 e 2010 foi realizado o terceiro levantamento. Para tanto foram realizadas 107 horas de monitoramento aéreo entre 18/12/09 e 7/3/10, cobrindo 29 municípios dos estados de Mato Grosso, Rondônia e Pará, totalizando 14.830 km, quase três vezes a extensão Norte-Sul do Brasil.

 

 

Os critérios para a seleção das áreas a monitorar foram:

Áreas superiores a 25 ha total ou parcialmente situadas no bioma Amazônia;

Restrito aos estados de MT, RO e PA;

Situadas fora das áreas protegidas e dos assentamentos;

Em municípios com área de soja superior a 5.000 ha;

O leitor pode acessar as imagens de cada polígono vistoriado através da Internet, pelo endereço http://www.abiove.org.br/ss_relatoriouso09_br.asp

 

Resultados

O terceiro levantamento, concluído em 2010, referenda o que já se sabia: o plantio de soja no bioma Amazônia é absolutamente marginal. Foram identificados 6.295 ha, desmatados após julho de 2006, nos quais foi constatado o plantio de soja. Para efeito comparativo, esta área corresponde a 0,25% do desmatamento ocorrido na Amazônia, no mesmo período. Ou seja, o plantio de soja não é o vetor do desmatamento. Por outro ângulo de análise, a área irregular corresponde a 0,027% da área de plantio de soja brasileira (23,2 milhões de ha), demonstrando que o plantio de soja nestas condições não apresenta qualquer importância econômica.   No primeiro monitoramento (safra 2007/08), a área total monitorada foi de 49.809 ha. Após sobrevôo e identificação do uso da terra, concluiu-se que não havia plantio de soja nestas áreas. No segundo monitoramento (2008/09), a superfície monitorada passou para 157.896 ha. Foi registrado o cultivo de soja em 1.384 ha de plantio de soja. No terceiro ano, a superfície monitorada aumentou para 302.149 ha e foram identificados 6,3 mil ha de plantio de soja.

 

A sequência de resultados pode levar à conclusão errônea de que o plantio de soja no bioma Amazônia aumentou a cada ano, desde o inicio do monitoramente. Na realidade, o que ocorreu é que o monitoramento foi sendo aprimorado gradualmente, com aumento da área de cobertura e refinamento da metodologia, o que permitiu uma detecção cada vez mais precisa de áreas irregulares. O aumento da área plantada com soja na presente safra é apenas aparente, reflete a maior abrangência da área monitorada e decorre de diversos fatores:  

1. aprimoramento da metodologia pela inclusão dos polígonos de 25 a 100 ha que antes eram apenas amostrados e junção de polígonos contíguos inferiores a 25 ha que não faziam parte do levantamento;

2. acréscimo de novos polígonos referentes a mais um ano;

3. maior disponibilidade de áreas aptas para plantio, abertas há mais tempo; e

4. conjuntura favorável do mercado internacional que estimulou a retomada da área recorde plantada de 2004/05.

Em conclusão, a Moratória da Soja é uma iniciativa meritória, absolutamente em linha com as necessidades de sustentabilidade do agronegócio brasileiro, que liderará o mercado mundial por sua competitividade intrínseca, com respeito ao meio ambiente.  

Tabela 1. Resultados do monitoramento da Moratória da Soja (2010).

Estado

Área plantada com soja nos municípios monitorados

Polígonos da moratória

Total

% do total

Mato Grosso

4.670

1.559.059

0,30%

Pará

1.596

63.425

2,52%

Rondônia

29

108.900

0,03%

Total

6.295

1.731.384

0,36%

 

 

Produtividade da agropecuária
Décio Luiz Gazzoni

O crescimento populacional - com taxas em progressiva desaceleração - e a inserção social - com taxas em progressiva aceleração - serão os principais vetores da demanda de produtos agrícolas, nas próximas décadas. Com as restrições físicas e ambientais à incorporação de novas áreas e o aumento da insegurança da produção, por força das mudanças climáticas globais, a grande saída que o mundo dispõe para aumentar a produção - diminuindo o custo dos alimentos e mantendo a renda dos agricultores - é a tecnologia adequada e seu corolário prático, a produtividade agrícola.   O progresso da agricultura pode ocorrer devido ao aumento real de preços da produção (ou efeito "relações de troca"); por incorporação de novas áreas agrícolas; e por aumento da produtividade. O aumento dos preços reais (ou melhoria das relações de troca) aumenta o valor da mesma quantidade da produção, enquanto a expansão da área e o aumento da produtividade implicam em aumento da produção física.   A produtividade guarda estreita relação com tecnologia. Rendimentos mais altos podem ocorrer a partir de intensificação do uso das tecnologias existentes (mais fertilizantes por hectare) ou de uma maior eficiência no uso de insumos em geral (mais produção com o mesmo nível de insumos). Maior eficiência no uso de insumos significa crescimento da produtividade total.

 

Existem diferentes abordagens para analisar a produtividade agrícola. Uma das fórmulas mais adequadas é a medida da produtividade total dos fatores (PTF). Por esta metodologia, a produção obtida é contrastada com os fatores ou insumos utilizados para obtê-la, proporcionando uma visão mais abrangente das necessidades de recursos para produzir os resultados. Por exemplo, o aumento de 1% na PTF significa que se necessita 1% menos recursos ou insumos para obter determinada produção. Por outro ângulo, se os preços dos insumos permanecem inalterados, então o custo médio de produção reduz-se em 1%.   Cada vez mais temos que pensar o agronegócio brasileiro sobre o pano de fundo do comércio agrícola internacional, porque a vocação do nosso país é ser protagonista neste mercado. Por este motivo, interessou-me um estudo realizado pelo Dr. Keith O. Fuglie, do ERS/USDA, publicado em setembro de 2010. O pesquisador calculou a PTF de 15 países, com estudos específicos para algumas regiões, permitindo extrapolar os valores para o restante dos países. O modelo fornece uma medida do crescimento da PTF agrícola ao longo do tempo para cada país, região e para o mundo.

Resultados

Os resultados sugerem que a PTF global tem acelerado e é responsável por uma parcela cada vez maior do crescimento na produção agrícola mundial. De acordo com o Dr. Fuglie, a produção agrícola mundial cresceu cerca de 2,2% a.a. entre 1961 e 2007, com uma taxa de crescimento excepcionalmente alta de 2,8% a.a., na década de 1960, e crescimento médio anual entre 2,0 a 2,3% nas décadas seguintes. O aumento no uso de fertilizantes foi o principal fator de crescimento da produção agrícola nas décadas de 1960 e 1970, devido ao uso de variedades de cereais altamente responsivas à adubação, nos países em desenvolvimento (Revolução Verde). O uso de fertilizantes também aumentou consideravelmente na União Soviética durante estas décadas, quando o adubo foi fortemente subsidiado.

  Mesmo assim, o uso de insumos agrícolas desacelerou-se gradualmente entre 1960 e 2007, enquanto a taxa de crescimento da PTF foi se acelerando, mantendo o crescimento do produto real em pouco mais de 2% a.a. O modelo demonstrou que o uso de insumos na agricultura mundial foi excepcionalmente baixo durante a década de 1990, devido à rápida retirada de recursos da agricultura nos países do antigo bloco soviético. Ocorre que os insumos usados nesses países aparentemente não eram aplicadas de maneira eficiente, logo a diminuição de seu uso aumentou significativamente a produtividade média dos demais recursos na agricultura, evidenciada pela alta taxa de crescimento da PTF na década de 1990.

O estudo do Dr. Fuglie revelou três padrões gerais do crescimento da produtividade global:

1. Nos países industrializados, o crescimento da PTF ajudou a compensar um declínio nos recursos empregados na agricultura. No entanto, o crescimento da PTF, de apenas 0,9% a.a durante 2000-07, foi o menor de qualquer década desde 1960, o que pode indicar a necessidade de novos breakthroughs tecnológicos;

2. A dissolução da URSS em 1991 representou um grande choque para a agricultura nos países do antigo bloco soviético. Na década de 1990, os recursos agrícolas contraíram-se fortemente, com queda significativa na produção destes países. No entanto, nesta década, já sob um regime capitalista, o uso de recursos agrícolas se estabilizou e o crescimento da produção foi retomado exclusivamente por ganhos de produtividade;

 

3. Nos países em desenvolvimento a produtividade acelerou-se a partir da década de 1980. A China e o Brasil têm registrado robusto crescimento da PTF nas últimas três décadas. Já em outras regiões como a África Subsaariana, Ásia Ocidental e Caribe, a baixa produtividade agrícola está ligada à pobreza generalizada e conduz à insegurança alimentar.

A redução do uso de insumos e o aumento da PTF têm implicações importantes para a oferta adequada de alimentos. A principal alavanca para aumentar o crescimento da PTF é incrementar os investimentos em pesquisa agrícola e transferencia de tecnologia. Lembrando que o período de maturação é sempre longo, e que os impactos de novas tecnlogias sempre ocorrem no médio e longo prazos. Portanto, investir agora é a única forma de garantir a segurança alimentar do futuro.

 

Novas tecnologias
Décio Luiz Gazzoni

O mês de maio foi movimentado. O acidente ocorrido em 20 de abril, com a plataforma de petróleo da British Petroleum no Golfo do México, foi assunto recorrente na imprensa mundial. A principio, pelo acidente em si. Porém, passados alguns dias, ficou claro que o acidente era muito sério, que poderia não se tratar de um caso isolado, e que não havia tecnologia comprovada e disponível para conter o vazamento de petróleo no oceano. Até agora foram dezenas de milhões de barris derramados na água, sem que surja uma perspectiva real de solucionar, definitivamente, o problema. E, especialmente, de evitar que o problema torne a acontecer no futuro.

Enquanto isto, o impacto ecológico é incomensurável, a ponto de obnubilar o impacto financeiro, do qual ninguém fala, porque se tornou secundário. Pressionado pela opinião pública, no dia 27 de maio o presidente Barrack Obama sustou investimentos em prospecção e extração de petróleo no Golfo, por um período mínimo de 6 meses, até que seja comprovado que a retomada dos trabalhos pode ser efetuada com segurança. Esta é uma decisão muito pesada para um país que importa mais de 90% do petróleo que consome.

 

 

A imprensa mundial desdobrou o tema em dois grandes aspectos. O primeiro foi questionar a segurança da extração de petróleo em águas profundas, o que possui reflexo imediato na exploração das reservas de pré-sal brasileiro. A ponto de que, nos bastidores da política, os nossos congressistas prefiram empurrar o tema da regulamentação da sua exploração para um futuro suficientemente distante das eleições, a fim de não serem tragados para o bojo das discussões sobre o acidente ecológico no Golfo, tema politicamente explosivo o suficiente para que a discussão do assunto seja temporariamente suspensa.

O segundo desdobramento é a substituição de fontes fósseis, sujas, por energia renovável. Sempre que o meio ambiente é agredido, este assunto vem à tona (sem trocadilho com o vazamento do petróleo!), e o tema foi revisitado nos cinco continentes, porém com maior repercussão no Hemisfério Norte, onde estão os grandes consumidores de energia, coincidentemente os maiores prejudicados com os efeitos adversos do uso de energia suja.

Mas, aqui no Brasil, o tema também movimentou a imprensa. E, embora sem conexão direta com o vazamento do Golfo do México,duas notícias em particular chamaram a atenção: no Rio, ônibus propelido por eletricidade e célula de combustível; em São Paulo, ônibus propelido por diesel vegetal, mantendo o mesmo motor diesel original de fábrica.

  Ambas as tecnologias já vinham sendo estudadas havia muito tempo, sendo mera coincidência a sua divulgação pública no momento em que um enorme desastre ecológico foi provocado por exploração de petróleo em águas oceânicas. Mas, sem dúvida, a opinião pública é mais favorável e receptiva a notícias envolvendo tecnologias limpas quando as sujas estão emporcalhando o ambiente.

Ônibus a hidrogênio

A primeira impressão transmitida pela imprensa que cobriu a apresentação do ônibus ao público foi: o ônibus não faz barulho! O barulho chato dos motores diesel, com o qual os passageiros de ônibus têm que conviver, sumiu. Isto porque o motor diesel também sumiu. A segunda impressão foi que, em vez de fumaça, o cano de descarga elimina vapor d´água.

No lugar do motor à combustão, entram outras formas de propulsão mecânica. A primeira é um conjunto de baterias, que podem ser carregadas numa tomada da rede elétrica, quando o veículo está parado na garagem. A segunda fonte é o hidrogênio, que abastece pilhas a combustível de óxido sólido, que são geradores de energia elétrica. E a terceira fonte é a recuperação da energia cinética, que normalmente é perdida nos veículos, a qual é reinjetada no sistema. Um ônibus a diesel desperdiça energia cinética produzida quando o motorista freia ou não pisa no acelerador. No veículo a hidrogênio, ela se transforma em energia elétrica, armazenada em ultracapacitores.

O ônibus foi desenvolvido na COPPE (Instituto de Pós-Graduação e Engenharia) da UFRJ. Foi na COPPE que surgiu a primeira pilha a combustível produzida no Brasil, nos idos de 1980. O grupo envolvido nunca parou de pesquisar e a evolução conduziu ao ônibus apresentado ao público no Rio de Janeiro. Existem outros dez grupos de pesquisa no mundo que se dedicam ao desenvolvimento de veículos movidos a hidrogênio.

 

Um sistema de interligação conecta as três fontes aos diferentes equipamentos do veículo (ar condicionado, sistema de tração, acionamento de portas, etc.). A divisão do espaço interno foi idealizada para que houvesse o menor gasto possível de energia. Externamente, a carroceria do ônibus assemelha-se aos movidos a motores diesel. Sua capacidade é de 68 pessoas, sendo 27 sentadas, com uma rampa e uma área reservada para deficientes físicos.

O protótipo contou com financiamento de empresas privadas, Petrobras e FINEP. O ônibus experimental ganha as ruas já no segundo semestre deste ano, para transportar alunos e funcionários da UFRJ, e tem autonomia inicial de 300 km – o que é ótimo, comparativamente aos atuais veículos elétricos, de passeio.

Até o fim do ano, o veículo será incorporado à frota de uma empresa comercial, cumprindo o trajeto entre os aeroportos do Galeão e Santos Dumont, o que se constitui em uma excelente vitrine para inovações, por transportar pessoas de alto nível de informação, normalmente formadores de opinião. A expansão da frota será financiada por recursos de investidores privados.

Custo e benefício

Embora tenha custo maior do que os tradicionais veículos a diesel, sua venda será impulsionada pela Copa do Mundo e pelas Olimpíadas, duas excelentes vitrines políticas e comerciais. O custo de aquisição do ônibus movido a hidrogênio é maior do que os movidos a diesel. Porém, para aproveitar a cobertura de mídia nos dois eventos, o preço de custo dos ônibus não é uma barreira significativa.

Entrementes, o investimento torna-se factível no médio prazo pois, em cerca de três anos, já é alcançado um break even com os ônibus movidos a diesel. Ao contrário do transporte já disponível, o novo modelo, com tecnologia 100% nacional, tem aparato mecânico menor, portanto menor custo de manutenção e de reposição de peças, e menor custo de combustível.

 

A nova tecnologia chama a atenção pela sua limpeza e o menor impacto sobre o ambiente e a saúde humana. O veículo, que não emite poluentes, significa um enorme trunfo em tempos de aquecimento global e necessidade de redução de emissões de gases-estufa. Mas ele também gera uma economia significativa para o sistema de saúde pública. Se toda a frota da cidade de São Paulo fosse substituída por ônibus a hidrogênio, a cidade deixaria de desembolsar R$ 600 milhões com o tratamento de doenças respiratórias.

Porém o projeto da COPPE é mais ambicioso. Encontra-se em fase experimental o desenvolvimento de um ônibus elétrico híbrido a álcool e outro exclusivamente elétrico, cujos protótipos também devem entrar em operação brevemente. O veículo 100% elétrico não produz resíduos, por não operar com combustão. Mas sua autonomia é a menor entre os três e, por isso, ele é apropriado para trajetos mais curtos. O híbrido é um meio termo entre o ônibus totalmente elétrico e aquele apresentado ao público, propelido a hidrogênio.

Diesel vegetal

Na minha coluna de março (Próximas gerações de biocombustíveis: ficção científica?) descrevi o surgimento de um sucedâneo do petrodiesel, denominado diesel vegetal. Trata-se de um composto químico (farneseno), que nada mais é que um hidrocarboneto linear, com 15 átomos de carbono (C15H24), encontrado em quantidades variáveis no óleo diesel de petróleo. O petrodiesel é uma mistura complexa de substâncias orgânicas, com fórmula molecular média C13H29. Portanto, o farneseno é um hidrocarboneto que representa adequadamente o complexo químico do óleo diesel, emulando suas propriedades químicas e físicas, e atendendo as especificações do mesmo.

 

  Desde maio deste ano estão rodando, em São Paulo, ônibus em cujo tanque está presente o diesel vegetal, derivado de cana-de-açúcar. A responsável pelos testes de campo é a Mercedes-Benz, maior fabricante brasileira de ônibus e caminhões. Os ônibus foram alocados nas linhas de transporte de diversos pontos da cidade de São Paulo, submetidos às severas condições de tráfego, em especial congestionamentos. O desempenho desses veículos será comparado aos dos ônibus transitando na mesma rota, nas mesmas condições, porém abastecidos com petrodiesel.  

Os testes iniciais serão efetuados com 10% de diesel vegetal e 90% de petrodiesel. A mistura será enriquecida progressivamente com diesel vegetal, até atingir 100%. Do sucesso deste teste depende a velocidade com que o novo biocombustível ingressará no mercado.

É na área ambiental que se situa a grande vantagem do diesel vegetal. Ele não possui enxofre em sua composição, o que diminui fortemente o impacto ambiental, em especial os problemas com chuva ácida, corrosão de estruturas metálicas e problemas respiratórios. Os testes preliminares da Mercedes, em São Bernardo do Campo, mostraram uma redução de 9% na emissão de particulados com a adição de 10% de diesel vegetal, comparado ao diesel de petróleo puro. Quando os motores foram abastecidos com 100% de diesel de cana, a redução nas emissões de poluentes foi superior a 30%, comparado ao mesmo motor abastecido com petrodiesel.

 

O novo biocombustível é produzido pela empresa Amyris, em sua planta piloto localizada próximo a Campinas. A empresa está firmando acordos comerciais com usinas do setor canavieiro para expandir a produção de diesel vegetal. A informação disponível é que sua meta será produzir 400 milhões de litros em 2010 e 1 bilhão de litros em 2012. Para 2020, a expectativa é de produzir 80 bilhões de litros de diesel vegetal.

A intenção das empresas é usar o diesel de cana inicialmente como mistura no petrodiesel, por causa da baixa produção. Porém, no futuro, o diesel vegetal poderá ser utilizado em forma pura, sendo parte destinada ao mercado doméstico e o restante direcionado para exportação. Para efeito de comparação, é importante referir que a produção de biodiesel no Brasil, em 2010, será inferior a 2,5 bilhões de litros.

 

Um detalhe muito importante: o motor do veículo não precisa ser adaptado para rodar com o diesel vegetal, justamente porque o farneseno possui as mesmas propriedades físicas e químicas e atende as especificações para o óleo diesel. Quanto ao seu preço no varejo, ainda é cedo para estabelecer um patamar rigoroso, porém os comentários no mercado são de que o novo biocombustível será competitivo com o diesel, se o petróleo estiver acima de US$50,00 por barril.

Além do custo de produção, armazenagem e transporte, o que pode realmente fazer a diferença em favor do diesel vegetal – como de qualquer outra fonte de energia limpa - será a tributação incidente. Caso o Governo brasileiro decida efetuar uma aposta firme em uma Economia de Baixo Carbono, poderá haver um favorecimento tributário para o produto limpo, comparativamente à taxação do petrodiesel, o que facilitará a ampliação de seu market share.

Inovação tecnológica

A obtenção do diesel vegetal exige poucas modificações no processo e no maquinário de produção tradicional de etanol. Até a chegada do caldo de cana nos tonéis de fermentação, não há qualquer diferença em relação às usinas tradicionais. Assim como na produção de etanol, o caldo de cana recebe um fermento para decompor a sacarose. Para obter o diesel vegetal, é necessário usar um microorganismo modificado geneticamente pela Amyris, para desdobrar a sacarose até farneseno.

Após a fermentação ocorre uma fase de separação, seguida de outra etapa de finalização química, quando o produto está pronto para ir ao mercado. São duas etapas que substituem as fases de destilação e desidratação do etanol.

 

A tecnologia usada pela Amyris foi a da reengenharia de metabolismo, uma ferramenta básica do novo ramo da Ciência denominado Biologia Sintética. Nesta Ciência um dos processos básicos é a desconstrução, ou reengenharia reversa, em que a partir de um produto conhecido descobre-se a rota bioquímica para sua obtenção. Entendido o processo, são efetuadas modificações no código genético do microrganismo, de maneira que o produto final gerado pelo seu metabolismo seja a substância desejada – neste caso o farneseno.

As modificações genéticas foram direcionadas para a secreção de farneseno pelo Saccharomyces cerevisae, que, em seu estado natural, secreta apenas etanol. O farneseno é um líquido incolor, uma das múltiplas substâncias que compõem o diesel fóssil. Seu valor comercial reside no fato de possuir as mesmas propriedades do diesel.

Passado e futuro

A gênese da Amyris ocorreu na área farmacêutica. O primeiro produto da empresa foi a síntese em laboratório da artemisinina, princípio ativo de um medicamento contra a malária muito usado na África e na Ásia. Até então ela era extraída da própria planta artemísia (Artemisia annua), num processo caro que exige grandes quantidades do vegetal. A equipe da Amyris conseguiu produzir a artemisinina por meio da reengenharia genética de uma bactéria muito usada em laboratório, a Escherichia coli. Novos genes, enzimas e açúcar fazem a bactéria modificada produzir o medicamento. Com isso o produto foi barateado em 90%, segundo a empresa.

Os estudos que redundaram na produção comercial de diesel vegetal começaram com os pesquisadores da empresa, que tem sede na cidade de Emeryville (Califórnia), onde foi efetuado o sequenciamento do genoma da levedura. De posse deste mapa genético, em especial com a identificação dos genes responsáveis pela produção do etanol, foram efetuadas 15 substituições no código genético da levedura, o que modificou a rota metabólica do microorganismo.

  Os planos futuros da Amyris não se limitam ao diesel vegetal. Está prevista a produção de bioquerosene de aviação, biogasolina, e uma série de especiarias de química fina e farmacêutica, formando uma complexa biorefinaria. Tudo isto utilizando biomassa como matéria prima, especialmente a cana. Neste particular seremos atropelados por uma espetacular dinâmica tecnológica. Ainda recentemente, um grupo de pesquisadores de uma empresa norte-americana que atua na mesma área, obteve biodiesel (o éster metílico de ácidos graxos) a partir de hemicelulose. Trata-se que uma enorme quebra paradigmática, pois permite o aproveitamento integral da biomassa da cana para obtenção de produtos nobres, sem ficar restrito à sacarose contida no caldo da cana.

 

Projeções

Por força de ofício, tenho realizado estudos de cenários de oferta e demanda de biocombustíveis e de suas matérias primas, bem como da demanda de área e insumos para sua produção. O estudo de cenários prevê reanálises constantes, em função de modificações em parâmetros demográficos, questões macroeconômicos, estrutura do mercado, inovações tecnológicos ou outros fatores, como as questões ambientais.

A Figura 1 consolida uma nova visão de futuro do mercado de combustíveis, incluindo biocombustíveis, incorporando os avanços tecnológicos mais recentes.

Figura 1. Projeção de consumo de combustíveis no Brasil, em um cenário de crescimento intermediário da economia.

Um dos avanços considerados nesta revisão é o ingresso do diesel vegetal no mercado, de forma competitiva. Apesar das previsões otimistas da empresa produtora, mantivemos valores mais conservadores nesta análise, até que os testes de campo indiquem com clareza a sua viabilidade técnica, e as condições de mercado sinalizem a sua competitividade.  

Entretanto o diesel vegetal não é o único biocombustível sucedâneo do petrodiesel. No médio prazo, antes da ascensão do diesel vegetal, o etanol ocupará parcela deste mercado, com o ingresso de novas tecnologias de uso deste combustível em mistura ou em associação com o diesel.

As mudanças no perfil de mercado de biocombustíveis altera a demanda de área de terra necessária para a obtenção de matérias primas, mostrada na Figura 2.

Figura 2. Área necessária para produção de biocombustíveis.

Para esta atualização levamos em consideração alguns fatos recentes como o surgimento do diesel vegetal e o lançamento do programa da palma de óleo (dendê) no norte do país, o que contribuirá decisivamente para a oferta de óleo vegetal no país, consequentemente para a produção de biodiesel. O maior volume de biocombustíveis virá da cana-de-açúcar, razão pela qual ela ocupa mais área.

  A área destinada a oleaginosas diminui a partir do final da próxima década porque o óleo obtido em um hectare de dendê equivale àquele produzido em 10 hectares de soja. E ambas as curvas não seguem a mesma aceleração da oferta de biocombustíveis, porque está embutido no cálculo um ganho de produtividade por incorporação de tecnologias (agronômicas e industriais).   Mas, nem só de biocombustíveis vivem os carros, como o ônibus a hidrogênio demonstrou. Já vínhamos trabalhando com a inserção no cenário do deslocamento parcial de combustíveis líquidos pela eletricidade, pelo hidrogênio e por células de combustível (preferencialmente bioeletricidade, biohidrogênio e biomassa para as células). A Figura 3 mostra este contexto.

 

                                                        Tempo

Figura 3. Market share de veículos híbridos ou movidos a eletricidade, célula de combustível ou hidrogênio.

Entendemos que os atuais carros híbridos (mistos de motores a explosão interna e motores elétricos) nada mais sejam que carros conceitos que ingressam feito cunha em um mercado ávido por novidades e tecnologias brandas, servindo como precursores de um novo paradigma tecnológico.

Porém seu alto custo, sua ineficiência relativa e sua baixa autonomia limitam seu ingresso no mercado. E a própria evolução dos motores elétricos e, em especial, das baterias (mais leves e com maior capacidade de armazenagem) farão com que o carro elétrico ocupe espaço crescente, eliminando o híbrido, que é meramente transitório.

 

As pesquisas com microrganismos engenheirados, para produção de biohidrogênio molecular (H2) avançam em diversos laboratórios e, em pouco mais de uma década, poderemos dispor de biofábricas produzindo biohidrogênio comercial. Igualmente, as pesquisas com células de combustível avançam com rapidez, em diversas partes do mundo. Já existem inúmeros carros conceito rodando com células de combustível, e seu ingresso em larga escala no mercado também deve ocorrer na década de 20.

Concluindo, reiteramos nosso alerta de que as próximas décadas serão caracterizadas por dois vetores principais: o surgimento constante de novos negócios e uma intensa dinâmica tecnológica. Os empresários que não estiverem permanentemente atentos acabarão sendo expelidos do negócio.

 

Análise do Impacto Ambiental da Política Pública de Biocombustíveis nos EUA
Décio Luiz Gazzoni

Em fevereiro de 2010, a EPA (Environmental Protection Agency) publicou o documento final de análise do impacto ambiental dos biocombustíveis para uso nos Estados Unidos, no âmbito de sua política pública (Renewable Fuel Standard Program (RFS2) Regulatory Impact Analysis). O documento é muito extenso (1.120 páginas), compõe-se de 7 capítulos e um apêndice (veja relação ao final deste artigo), tratando todos os aspectos com profundidade e riqueza de detalhes.

 

  A substituição de combustíveis derivados de petróleo (como a gasolina e o óleo diesel) por combustíveis renováveis pode apresentar determinados impactos ambientais e econômicos. A legislação americana que regula a substituição de combustíveis fósseis por renováveis exige a análise dos impactos ambientais (Regulatory Impact Analysis - RIA) para avaliar os impactos de um aumento na produção, distribuição e utilização dos combustíveis de origem renovável, compatível com os volumes estabelecidos pelo Congresso no RFS (Renewable Fuel Standard), previstos na Lei de Independência e Segurança Energética de 2007 (EISA). No caso, esta análise se trata de uma exigência legal diretamente vinculada ao RFS2.

O estudo é uma determinação legal e objetiva fornecer uma avaliação dos impactos previstos, quando estas normas forem totalmente implementadas. Estas informações podem então ser utilizados em futuras decisões de política pública. O documento liberado em fevereiro representa uma avaliação atualizada em relação ao projeto RIA, realizado em apoio à Notificação de Proposta de Regulamentação (NPRM), editado anteriormente, e que recebeu inúmeros aportes e contribuições, inclusive de organizações brasileiras, como a ÚNICA e a ABIOVE.

  A EPA ressalta que as estimativas contidas no estudo não devem ser interpretadas como o impacto da implementação das normas RFS2, tendo em vista que estas impõem um valor mínimo de uso de biocombustíveis. Entretanto, as forças de mercado ou a pressão social por combustíveis limpos podem levar ao aumento da produção e uso de combustíveis renováveis, além do previsto nas normas RFS2 – e a EPA adotou este conceito. Deste modo, a abordagem analítica tomada pela EPA nesta RIA é estimar os impactos, com base em uma série de fatores econômicos e ambientais, considerando o aumento do uso de combustíveis renováveis ao nível exigido pelas normas RFS2.

Comparativos

Os resultados do estudo são comparados com dois casos de referência, à margem do do programa RFS2. O primeiro caso de referência é uma projeção feita antes do estudo atual pela E.U. Energy Information Administration (EIA), em seu Annual Energy Outlook 2007 (AEO2007), que estima os volumes de biocombustíveis que seriam usados em 2022 (total de 13,56 bilhões de litros). O segundo caso de referencia é o AEO2009, que já inclui o impacto das normas RFS2 bem como as novas regras que exigem motores mais eficientes para economizar energia.   Ao usar estas duas referencias, separadas por apenas dois anos, a EPA verificou que, até 2022, os custos de produção de combustíveis renováveis vão diminuir e os preços do petróleo vão subir, a ponto de os combustíveis renováveis se tornarem mais baratos do que a gasolina e o óleo diesel, mesmo na ausência de qualquer subsídio. O fato pode ser verificado no AEO2009, que trabalho com a média de US$116 por barril de petróleo bruto em 2022, comparativamente aos US $ 53 por barril da projeção AEO2007. Isso implica que as forças do mercado promoveriam um aumento do volume de combustível renovável utilizado, além do que foi projetado pelo AEO2007, mesmo na ausência das normas RFS2. Estes valores de preços de petróleo são coerentes com as estimativas possíveis, com base nas condições de mercado em cada uma das datas em que foram conduzidas os estudos.

 

No entanto, é difícil estimar em que medida estas forças de mercado, na ausência das normas RFS2, de fato promoveriam os investimentos necessários para aumentar a produção e o uso de combustíveis renováveis. Considere-se que a relação de preços se torna favorável para os biocombustíveis não apenas porque o preço do barril de petróleo aumenta, porém porque diminui o custo de produção dos biocombustíveis, por avanços tecnológicos, ganhos de escala e melhora da gestão.   Dada a magnitude do investimento de capital necessário para produzir o volume de combustível renovável previsto no RFS2, realmente a política pública é o fator principal que vai alavancar os negócios no setor, pois grande parte do etanol a ser produzido é uma aposta na entrada de tecnologias competitivas para obtenção de etanol celulósico. Estas tecnologias ainda estão em fase pré-embrionária e apenas a imposição das normas do RFS2 pode alavancar o salto da etapa de protótipo para as grandes usinas.   Isto posto, devido à dificuldade de projetar volumes de combustíveis renováveis, na ausência das normas RFS2, após a sua entrada em vigor, a EPA optou por se basear nas projeções do AEO2007 como caso de referência primária. A EPA considera que o volume efetivo de combustível renovável que seria utilizado na ausência das normas RFS2 ficaria entre as projeções do AEO2007 e os volumes resultantes das projeções considerando a RFS2. Por isso, a EPA destaca que o impacto estimado na RIA não pode ser interpretado como o impacto do programa RFS2 em si. Ao contrário, o RIA é uma estimativa do impacto de um aumento no uso de combustíveis renováveis, causado tanto pelo RFS2 quanto pelas forças de mercado.

 

Impactos no Brasil

Examinando o documento emitido pela EPA, outra limitação importante é que ele não considera os efeitos de certas compensações. Em particular, para as emissões americanas (tanto de GEE e de não GEE) e para a qualidade do ar sobre o seu território, a EPA supõe que a produção de combustíveis renováveis para atender as imposições do RFS2 resulta em uma redução equivalente (em termos de unidades de energia) na produção de combustíveis derivados do petróleo. Entretanto, ao menos em teoria, existe a possibilidade concreta de que o aumento do uso de combustíveis renováveis em escala mundial, possa reduzir os preços do petróleo bruto, o que poderia levar a um aumento na quantidade de petróleo bruto exigido.   No entanto, a análise oposta também pode ser feita, ou seja, a viabilização comercial de energia renovável (mesmo a preços superiores às energias fósseis, porém dentro de limites suportáveis) pode gerar uma onda de consciência cívica ao redor do mundo e manter reduzido o consumo de petróleo, mesmo com preços mais baixos. E o diferencial de demanda de energia seria ocupado por fontes renováveis.   A Tabela 1 apresenta os resultados de algumas análises contidas no documento liberado pela EPA. O número que mais chama a atenção é a diminuição de 138 milhões de toneladas de emissões de Gases de Efeito Estufa (GEE). Porém, do ponto de vista de negócios, nos interessa muito de perto o cálculo de redução anual de 13,6 bilhões de galões (51,5 bilhões de litros) no uso de combustíveis fósseis. Devido à diferença no poder calorífico inferior entre os biocombustíveis e os combustíveis derivados de petróleo, pode-se estimar um consumo superior a 70 bilhões de litros de um mix de etanol, biodiesel e combustíveis de terceira geração. Como não acredito que os EUA possam produzir todo este volume, abriria uma oportunidade de renegociar as barreiras técnicas e tarifárias que são impostas à importação de etanol e de biodiesel do Brasil.

 

Um cálculo simples mostra que, se os EUA adotassem em 2022, por hipótese, a mesma mistura B5 em vigor atualmente no Brasil, significaria uma demanda anual superior a 20 bilhões de litros. Para tanto, seriam necessários 110 milhões de toneladas de soja, porém dificilmente os EUA poderiam produzir mais de 100 milhões. Mesmo que todo o óleo de soja fosse destinado ao biodiesel (o que não seria possível), ainda faltariam 1,7 bilhões de litros de biodiesel.   Há uma boa notícia para os produtores agrícolas, porém não tão boa para os consumidores e mesmo para os produtores de biodiesel. A pressão sobre a demanda de soja, que representa 98% da produção americana de oleaginosas, ocasionará um aumento de seu preço real de 10,3% em 2022. Na mesma época, o impacto sobre o preço do milho será de 8,2%. Como os EUA reduzem as exportações de milho em 8% e de soja em 14%, alguém terá que ocupar este espaço, porque a demanda de soja e milho continuará muito forte até 2022 (e mesmo depois desta data).

 

O candidato a ocupar a maior parcela individual deste mercado é, seguramente, o Brasil. A conjunção da ameaça com a oportunidade deve redundar em um estudo aprofundado de como o Brasil será impactado, para que nos preparemos ao longo dos próximos 12 anos para potencializar as oportunidades e mitigar as ameaças.

  Finalmente, o estudo monetiza todos os impactos, concluindo que, no espectro dos cenários analisados, os EUA teriam um ganho variável entre US$13 a US$26 bilhões. Estes números são altamente positivos e otimistas e, seguramente, auxiliarão a manter tanto o Executivo quanto o Legislativo americano no eixo proposto pela RFS2. Ou seja, do ponto de vista do Brasil, podemos considerar nos nossos cenários para prospecção futura que os EUA agirão muito em acordo com o que foi aprovado na legislação.

 

A dúvida continuará sendo a capacidade americana de suprir a demanda, em particular a factibilidade técnica e econômica do etanol celulósico, e a disposição de negociar as barreiras à importação de biocombustíveis de outros países.

Tabela 1. Sumário dos impactos do uso adicional de combustíveis renováveis, decorrentes da aplicação das normas da RFS2 no ano de 2022, comparativamente ao caso de referencia (AEO2007)

Categoria Impacto em 2022
1. Emissões e qualidade do ar  
Emissões de GEE -138 milhões de toneladas
Emissões não-GEE -1 to +10%, dependendo do poluente
Ozônio +0,12 ppb
Particulados PM2.5 +0,002 μg/m3
Etanol +0,409 μg/m3
Outros poluentes tóxicos -0,0001 to -0,023 μg/m3 dependendo do poluente
PM2.5- 33 a 85 casos adicionais de mortalidade adulta
Mortalidade prematura devido ao ozônio 36 a 160 casos adicionais de mortalidade adulta
   
2. Outros impactos ambientais  
Descarga no Rio Mississippi Nitrogênio: +1,43 billion lbs. (1,2%)

Fósforo: +132 million lbs. (0,7%)

   
3. Custo dos combustíveis  
Custo da Gasolina -2,4¢/gal
Custo do Diesel -12,1 ¢/gal
Custo total de combustível -$11,8 bilhões
Consumo de diesel e gasolina - 13,6 bilhões de galões
   
4. Custo de capital  
Total do Custo de Capital até 2022 $90,5 Bilhões
   
5. Custo da Alimentação  
Milho +8,2%
Soja +10,3%
Alimentos +$10 per capita
   
6. Impactos econômicos  
Segurança energética +$2,6 bilhões
Impactos na saúde -$0,63 to -$2,2 bilhões
Impactos sobre o custo social do carbono +$0,6 to $12,2 bilhões
Importação de óleo -$41,5 bilhões
Alimentos dentro da porteira +$3,6 bilhões
Ingressos dos agricultores +$13 bilhões (+36%)
Exportação de milho -$57 milhões (-8%)
Exportação de soja -$453 milhões (-14%)
   
7.Beneficios totais em 2022 +$13 to $26 bilhões

Cálculos usando valores de 2007

 

Capítulos do Relatório:

Chapter 1: Renewable Fuel Production and Consumption

Chapter 2: Lifecycle GHG Analysis

Chapter 3: Impacts of the Program on Non-GHG Pollutants

Chapter 4: Impacts on Cost of Renewable Fuels, Gasoline, and Diesel

Chapter 5: Economic Impacts and Benefits

Chapter 6: Impacts on Water

Chapter 7: Initial Regulatory Flexibility Analysis

Appendix A: Biodiesel Effects on Heavy-Duty Highway Engines and Vehicles

 

Tendências transformando-se em realidade
Décio Luiz Gazzoni

Há uma década o celular pesava 500 gramas, praticamente só podia ser utilizado na cidade ou no estado de origem, e falar do exterior nem pensar! Para acertar as suas configurações, só um expert. Hoje, um celular pesando 50 gramas nos acompanha a qualquer parte do mundo, sem ficar surdo ou mudo. Detalhe: telefonar é apenas uma das 100 funções que o pequeno aparelho executa, e sua manipulação é intuitiva.

Também há uma década, o cidadão que alertasse para o brilhante futuro da química verde ou da energia renovável era comparado a Don Quijote de la Mancha, o inesquecível personagem de Miguel Cervantes y Saavedra.

Não mais! Até o país paradigma dos velhos negócios - da velha química e da velha energia – se rendeu aos ventos que sopram do futuro. O Governo dos Estados Unidos criou o Presidential Green Chemistry Challenge Award, cuja concessão é coordenada pela Environmental Protection Agency (EPA). O prêmio é tido como a maior honraria concedida na área ambiental, nos EUA.

 

O Presidential Green Chemistry Challenge Award foi instituído para distinguir tecnologias que contribuam significativamente para reduzir a poluição nos Estados Unidos, incorporando os princípios da química verde na concepção, fabricação e uso de produtos químicos. Os vencedores deste prestigioso prêmio são selecionados por um painel internacional de peritos convocada pela American Chemical Society.

Química Verde - também conhecida como química sustentável - é uma filosofia de pesquisa química e de engenharia de processos, que incentiva o design de produtos e processos que minimizem o uso e a geração de substâncias perigosas. Isso inclui o uso de matérias-primas sustentáveis e processos de produção mais eficientes, desde que os processos sejam tecnica e economicamente viáveis.

Entre os vencedores do prêmio deste ano destaca-se a LS9 Inc., uma empresa de base biotecnológica, com sede em San Francisco (Califórnia). A razão objetiva para a concessão do prêmio é o conjunto de tecnologias desenvolvidas pela empresa, que permitem a obtenção de biocombustíveis e outros produtos químicos, com baixa emissão de carbono. A tecnologia foi patenteada com o nome Renewable Petroleum™ e permite transformar material orgânico, especialmente derivados de vegetais, em biocombustíveis e outras especiarias químicas.

LS9

A LS9 foi fundada em 2005 e recebeu financiamentos de risco de fundos como Flagship Ventures, Khosla Ventures, Lightspeed Venture Partners e Chevron Technology Ventures. A empresa também firmou uma parceria estratégica com a Procter and Gamble (mais informações em www.ls9.com). A companhia faz parte de uma nova tendência industrial, que utiliza biomassa como matéria prima e processos baseados em Biologia Sintética, para obter substâncias úteis à sociedade, com menor impacto ambiental.

  A plataforma tecnológica da LS9, lastreada em futurísticas técnicas de Biologia Sintética, utiliza processos fermentativos para transformar matérias-primas renováveis em um amplo portfólio de produtos químicos, substituindo derivados da petroquímica, cuja principal característica são as baixas emissões de carbono. O portfólio inclui o UltraClean™ Diesel, para o qual a LS9 busca parceiro para fabricação no Brasil, e surfactantes, que serão comercializados por um parceiro estratégico (Procter and Gamble).   O UltraClean Diesel nada mais é que o substituto do petrodiesel, sobre o qual tenho escrito no Biodiesel BR. O diferencial da LS9 é que o produto obtido pelo seu processo fermentativo é um hidrocarboneto totalmente saturado (portanto, com maior densidade energética), enquanto outros biocombustíveis avançados e tecnologias de produção de substâncias químicas requerem passos adicionais em seus processos de produção. De acordo com a LS9, a tecnologia altamente eficiente de produção, constante de uma única etapa, lhe permite produzir combustíveis e produtos químicos que oferecem maiores benefícios ambientais sobre os produtos convencionais à base de petróleo, bem como em relação a outras tecnologias multi-passo utilizados na produção de biocombustíveis avançados.

 

Um detalhe interessante é que os processos fermentativos que produzem sucedâneos do petrodiesel não necessitam de destilação para sua separação, uma vez que o hidrocarboneto gerado é imiscível, criando fases distintas, que permite a separação por outros meios mais simples e mais baratos.  

De acordo com os estudos disponíveis, o UltraClean permite uma redução estimada de 85% nas emissões de gases de efeito estufa quando comparado ao diesel de petróleo convencional. Além disso, está livre de benzeno, uma substância cancerígena geralmente associada ao petrodiesel. E também de enxofre, que é o precursor da chuva ácida, causada pela emissões de compostos sulfurados durante a queima de combustíveis fósseis.

O futuro

O reconhecimento da LS9 no Prêmio de Química Verde sinaliza que é só uma questão de tempo até que empresas estejam fornecendo combustíveis renováveis e outros produtos químicos, substitutos de derivados de petróleo, com baixas emissões de carbono. São os sinais dos novos tempos, os ventos que sopram do futuro.   Conforme os novos processos passam da fase de concepção laboratorial para as etapas de protótipo e pré-industrial, vão sendo delineados os contornos de uma nova fase de negócios. A partir de biomassa, que pode ser produzida em larga escala, a baixo custo e com processos sustentáveis, podem ser obtidos biocombustíveis avançados e outros produtos da química fina.  

No caso dos biocombustíveis, a partir de plantas com alta capacidade de produção de biomassa (cana, florestas, pastagens, sorgo) ou de algas, é possível obter substâncias químicas com as mesmas propriedades físico-quimicas do petrodiesel, da gasolina ou da querosene. Com isto, abrem-se os portões do futuro, com a produção de sucedâneos que os substituirão no médio prazo. Esta visão de futuro é muito importante, porque este deverá ser o paradigma dominante na década de 20. Quem quiser se candidatar a ser protagonista neste futuro, deve se preparar desde já para trilhar este novo caminho.

 

Biodiesel: mercado atual e perspectivas

Décio Luiz Gazzoni

Entre as publicações do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), uma delas tem sido objeto de minha leitura regular, pela temática interessante e pela abordagem sempre inteligente, aprofundada, contextualizada e de alta qualidade. Trata-se do BNDES Setorial que, em sua edição no 31, aborda o tema "Mercado brasileiro de biodiesel e perspectivas futuras", cujos autores são os técnicos do Banco André Pompeo do Amaral Mendes (economista do Departamento de Gás e Petróleo e Cadeia Produtiva da Área de Insumos Básicos) e Ricardo Cunha da Costa (assessor da Área de Infraestrutura).  

O documento compõe-se de 28 páginas, que sumarizarei para os assinantes do BiodieselBR, incorporando alguns comentários de minha lavra. Os autores ressaltam o sucesso do programa de produção e uso do Biodiesel, que antecipou em 3 anos sua meta final, graças à proatividade dos produtores de biodiesel, notadamente aqueles ligados ao ramo da soja. Mesmo com a antecipação da meta, os autores ressaltam o excesso de capacidade instalada para a produção de biodiesel, asseverando que o mesmo não deve ser eliminado no curto e no médio prazos, como veremos a seguir.

  Destacam as características específicas do mercado de biodiesel, como a negociação via mecanismo de leilão, que pretende assegurar a participação dos agricultores familiares no fornecimento de matérias-primas, tornar transparentes a formação de preços e as margens, e emitir sinais ao mercado em relação à estrutura e localização das plantas e quanto à escala ótima de produção.

 

 

Matérias primas

No artigo, os autores apresentam os dados da ANP, atualizados até setembro de 2009, mostrando que o óleo de soja responde por 74,88% da produção de biodiesel, seguido por gordura bovina (16,27%), óleo de algodão (6,16%) e outras fontes lipídicas (2,69%). Apesar dos números largamente favoráveis à soja, os autores consideram que este quadro deve se alterar no médio e longo prazo, tendo vista a baixa produção de óleo de soja, por unidade de área.

Neste particular, é importante prestar atenção ao programa de incentivo à produção de palma de óleo (dendê), lançado pelo Governo Federal este ano. Devido ao diferencial de produtividade de óleo entre soja e dendê, imaginando uma demanda de 2 bilhões de litros, necessitaríamos de 400.000 ha de dendê ou 4 milhões de ha de soja. Além disso, considerando apenas a cotação do óleo no mercado internacional (média de 2009), enquanto o óleo de soja foi cotado a US$826/t, o óleo de palma foi comercializado a US$633/t. Este diferencial de US$200,00 seria suficiente para cobrir os custos de transporte do produto. Ademais, percebe-se diversos movimentos entre atores públicos e empresariais, no sentido de adaptar a cultura do dendê ao Centro Oeste e Sudeste do Brasil (fora do eixo do Trópico Úmido), reduzindo os custos de frete.

 

Os autores apontam a alta viscosidade do óleo como a razão principal do fracasso da mamona enquanto matéria prima chave da produção de biodiesel. Entretanto, a nosso juízo, outras razões devem ser consideradas, em especial a baixa produtividade de óleo por ha, a falta de organização e estruturação da cadeia da mamona, a toxicidade da torta (que impede agregação de valor ao produto) e a elevada cotação do óleo, por ser um importante insumo para a indústria de química fina. Como referencia, em julho de 2010 o óleo de mamona estava cotado a US$1.610/t (FOB Índia), enquanto o óleo de soja era cotado a US$838/t (CBOT).

Os autores indicam como boas possibilidades futuras o cultivo de pinhão manso ou de algas, ressaltando, entretanto, que as informações disponíveis até o momento não garantem um sistema de produção adequado para investimentos em larga escala, em qualquer das duas alternativas.

Competitividade, formação de preços e margens

Os autores chamam a atenção para a importância da política pública de mistura compulsória pois, desde o início do programa de biodiesel, o seu sobrepreço em relação ao diesel foi, em média, 51,2% conforme Tabela 1. Ou seja, sem uma política mandatória, não teria sido possível introduzir o biodiesel em nossa matriz energética.

Tabela 1. Preço do biodiesel e do diesel

Ano

Biodiesel

R$/L

Diesel

R$/L

Diferença

%

2005

1,90

1,25

52,0

2006

1,79

1,36

31,6

2007

1,86

1,36

36,8

2008

2,60

1,47

76,9

2009

2,26

1,43

58,5

Média

2,08

1,37

51,2

Fonte: Adaptado de Pompeo e Mendes – ANP (Preço sem ICMS).

Os autores apontam que o custo de produção do biodiesel é fortemente vinculado ao custo da matéria prima. Em nosso entender, no caso da soja, a formação de preço do óleo não ocorre no mercado energético, porém no mercado nutricional, que possui maior elasticidade remunerativa. Portanto, não é lógico esperar uma adequação do preço do óleo de soja ao preço do diesel, muito embora exista uma associação entre preço internacional de petróleo e de óleos vegetais. Este fenômeno não significa que um esteja influenciando o preço do outro, porém que os mesmos fatores de formação de preços estão atuando sobre os dois segmentos.   O segundo aspecto importante na formação de preço é a concorrência entre produtores. Em novembro de 2009 existiam 63 plantas de biodiesel em operação no país, com capacidade instalada de 4,45 Mm3/ano, para uma demanda de 1,53 Mm3. No leilão de 17/11/09 participaram 40 plantas com autorização para comercialização e, da competição entre eles, ocorreu a formação do preço médio do leilão.

 

A Figura 1 mostra a margem devida ao custo de oportunidade entre vender o óleo de soja ou produzir biodiesel. No leilão de novembro de 2007, o excesso de capacidade fez com que a margem entre o preço do biodiesel e do óleo de soja ficasse levemente negativa.

Figura 1. Margem do biodiesel em relação ao óleo de soja

Fonte: Adaptado de Pompeo e Mendes (ANP e ABIOVE)

Os autores justificam o fato ressaltando que algumas empresas do setor adotaram uma postura agressiva nos leilões da ANP ao longo do ano de 2007, seguindo a estratégia de serem os primeiros a posicionar-se no mercado e de maximizar o seu market share. Por isso, houve competição intensa fazendo com que a margem ficasse próxima de zero (ou ligeiramente negativa) no dia do leilão. Em decorrência, algumas empresas passaram por dificuldades financeiras, sendo didático o ocorrido com a Brasil Ecodiesel, forçada a reestruturar-se e promover uma capitalização da dívida, com aumento do capital social.  

Em função deste comportamento no leilão, os autores referem que, como os preços de aquisição do biodiesel são fixados, no momento do leilão, válidos por três meses, e o preço dos óleos vegetais estava aumentando após o leilão, muitas empresas preferiram não produzir biodiesel e não entregar conforme os contratos.

O motivo é óbvio: caso esses produtores decidissem produzir biodiesel, operariam com margem negativa. Em conseqüência, os volumes entregues durante o ano de 2008 foram muito aquém dos leiloados. A Figura 2 demonstra que, quando a cotação do óleo de soja superou US$1.200/t a percentagem de cumprimento dos contratos despencou, atingindo um mínimo de 32% em junho de 2008. Quando a cotação do óleo de soja retornou a patamares inferiores a US$1.000/t, os percentuais de entrega situaram-se entre 85 e 100%.

Figura 2. Relação entre o volume de biodiesel entregue e o preço do óleo de soja

Fonte: Adaptado de Pompeo e Mendes (MME e USDA)

Para garantir sua margem, algumas empresas vencedoras do leilão compravam o óleo vegetal por três meses (mesmo prazo do contrato de fornecimento do leilão) a um preço fixo de seus fornecedores. Essas empresas não apresentaram prejuízos com a venda de biodiesel. Outras empresas que já tinham contratos de óleo vegetal preferiram vender o óleo vegetal em vez de produzir biodiesel. Assim, a Petrobras teve de realizar leilões de reposição de estoque durante o ano para que fosse cumprida a legislação.   Caracterizada a quebra unilateral de contrato sem motivo superveniente, a ANP exerceu sua função de agência reguladora, alterando as regras de leilão e de comercialização, para evitar inadimplências futuras, garantir o cumprimento da lei e, em especial, assegurar a credibilidade do programa junto aos atores econômicos e sociais.

Estrutura da indústria

Os autores analisaram a estrutura das industrias, classificando-as como empresas integradas, parcialmente integradas e não integradas.

As empresas produtoras de biodiesel integradas são aquelas que plantam ou comercializam a matéria prima (soja, girassol, algodão, etc.), esmagam o grão dessa cultura para produzir o óleo vegetal e produzem o biodiesel com base nesse óleo vegetal. As empresas integradas têm a opção de vender o grão, vender o óleo vegetal ou vender o biodiesel. Normalmente, essas empresas optam por vender os produtos que tiverem as melhores margens num determinado período. Essas empresas são as mais competitivas e mais eficientes na comercialização de biodiesel, conseguindo se apropriar de melhores margens do que as não integradas.

 

As empresas produtoras de biodiesel parcialmente integradas são aquelas que podem produzir o óleo vegetal - por disporem de planta de esmagamento - e biodiesel. Portanto podem comercializar tanto o óleo vegetal quanto o biodiesel. Essas empresas não plantam e nem comercializam os grãos.

As não integradas não têm a opção de fabricar produtos diversificados (biodiesel, óleo vegetal ou grão), uma vez que produzem única e exclusivamente biodiesel. Elas adquirem o óleo vegetal a preço de mercado e não a custo de produção como as empresas integradas. Elas estão focadas no mercado de biodiesel e precisam trabalhar continuamente, evitando as paradas usuais de uma produção flexível, para compensar o aumento de custo de matéria-prima.

Perspectivas de mercado

Os autores elaboraram três possíveis cenários futuros para a demanda nacional de biodiesel:

No primeiro cenário não haveria alteração na mistura de biodiesel a partir de 2010 conforme determina a lei, e supõe que a capacidade instalada será mantida ao longo do tempo. A demanda de biodiesel brasileira é estimada com base na projeção de demanda de diesel do país, que é função do nível de atividade e crescimento do Produto Interno Bruto – PIB e de outros fatores. Os autores assumiram que a demanda de diesel, consequentemente a de biodiesel, aumente cerca de 3,6% ao ano a partir de 2011. Neste caso, várias plantas de biodiesel no país serão desativadas ou ficarão ociosas, uma vez que não existirá demanda suficiente para todas as plantas. Essa ociosidade poderá propiciar a consolidação dos produtores do setor;

 

Em um segundo cenário, o governo alteraria a lei e aumentaria o percentual de mistura de biodiesel no diesel mineral para B6 em 2011 e B7 a partir de 2012, mantendo o crescimento em 3,6% ao ano a partir de 2013. Nesse cenário, a capacidade ociosa seria menor do que a do cenário anterior, e a demanda de biodiesel estaria próxima da capacidade instalada no final do horizonte analisado. Por volta do ano de 2016, haveria necessidade de novos investimentos em novas plantas de biodiesel para atender à demanda a partir dessa data;

  No terceiro cenário analisado, o governo alteraria a lei para aumentar a mistura de biodiesel no diesel mineral para B6 em 2011, B7 em 2012, e B8 em 2013. A partir de 2014, novamente, a demanda cresceria a 3,6% ao ano. Nessa alternativa, o excesso de capacidade estaria praticamente eliminado entre os anos 2014 e 2015. Nesse contexto, por volta de 2013 e 2014, haveria a necessidade de investimento em novas plantas de biodiesel para atender à demanda futura. Como nos outros cenários, nesse também não foram consideradas possibilidades de exportação do biodiesel nacional pelas razões já mencionadas. Caso haja essa possibilidade antes de 2014, o excesso de capacidade poderia deixar de existir antes dessa data.

 

Impactos dos cenários

Os autores pontuam que a grande questão que permanece é se, mesmo com o excesso de capacidade instalada de produção de biodiesel, a mistura de biodiesel no diesel mineral poderia ser aumentada sem nenhuma restrição. Na realidade a mistura não poderia aumentar como se não houvesse impedimento por quatro principais razões:

Existe uma restrição formal, prevista em lei, à mistura de até 5% (B5) de biodiesel no diesel mineral. Entretanto, essa restrição depende exclusivamente da vontade política do Governo;

Os fabricantes de motores a diesel teriam que assegurar a garantia dos motores que utilizassem misturas mais ricas que B5;

 

O custo do diesel para os consumidores se elevaria proporcionalmente ao aumento da adição de biodiesel, o que acarretaria o aumento do custo de produção de diversos produtos nacionais, uma vez que o principal modal de transporte brasileiro é o rodoviário. O Governo necessitaria analisar e implementar mecanismos de amortecimento deste impacto;

A produção de biodiesel na margem compete com a produção de alimentos, podendo elevar os preços de alguns alimentos devido à menor oferta para esse propósito ou ao maior custo da terra e da logística. É importante notar que o mercado de combustíveis é volátil e seu tamanho é expressivo em relação ao mercado de óleos vegetais, o que poderia colocar em risco a produção de oleaginosas empregadas na alimentação humana e de animais.

Conclusões

Ao final do texto, os autores alinhavam as seguintes conclusões:

A implantação de inúmeras plantas de biodiesel no país proporcionou êxito ao programa de biodiesel, uma vez que as metas impostas na lei de 2005 foram alcançadas com sucesso antes do prazo previsto;

A antecipação da implantação das unidades de biodiesel em todo o território nacional fez com que o setor operasse bem aquém da sua capacidade instalada, que assim permanecerá ainda por alguns anos se não houver aumento do percentual da mistura, encerramento de produção de algumas plantas ou possibilidade real de exportação;

Ao governo e à iniciativa privada brasileira está posto o desafio de negociar a extinção das barreiras (técnicas, ambientais, sociais) que impedem a exportação do nosso biodiesel para a Europa;

Concomitantemente, devem ser finalizadas as negociações para definir uma especificação global do biodiesel, acatada por países importadores e exportadores, o que permitirá a constituição de um mercado internacional;

 

Outra forma de tentar exportar o biodiesel, sem incorrer nos problemas de logística apresentados em países sem a adequada infraestrutura de distribuição para biocombustíveis, seria exportar para alguns países a mistura diesel/biodiesel, quando o Brasil se tornar exportador de diesel, o que se provavelmente ocorrerá em breve;

O índice de entrega de biodiesel nos últimos leilões da ANP tem sido próximo a 100%, após a introdução de penalidades pelo descumprimento dos contratos de venda de biodiesel;

A sistemática de leilões garante os menores preços para os consumidores e para a sociedade; garante igualdade de disputa entre pequenos e grandes produtores; facilita a fiscalização do cumprimento do percentual de mistura de biodiesel no diesel comercializado; e garante a participação mínima da agricultura familiar no fornecimento de matéria-prima ao exigir o selo social para participar nos leilões da ANP com 80% do volume negociado;

O grande desafio para o setor de biodiesel brasileiro é reduzir progressivamente a dependência da cadeia produtiva da soja. O setor, no curto e médio prazo, deveria buscar uma matéria-prima não alimentar, com custo menor e produtividade maior que a soja. No médio e longo prazos, a nova fronteira seria a produção de biodiesel a partir de algas marinhas, que não competem com alimentos e potencial de alta produtividade.

Aos interessados em ler o texto na íntegra, ele pode ser acessado em www.bndes.gov.br/SiteBNDES/export/sites/default/bndes_pt/Galerias/Arquivos/conhecimento/bnset/set3107.pdf

 

Testes de misturas de diesel e biodiesel

Décio Luiz Gazzoni

A pressão social por redução de emissões de Gases de Efeito Estufa, entre outros fatores, constitui-se na variável diretriz da incorporação progressiva de fontes de energia renovável nas matrizes energéticas dos diferentes países. O Brasil é um exemplo global, com o programa precursor de mistura etanol/gasolina e de substituição de gasolina por etanol, em larga escala. Na esteira desta conquista foi lançado o programa de produção e uso de biodiesel, tão bem sucedido que as metas foram alcançadas com 3 anos de antecedência.   Entretanto, é preciso contextualizar este processo. Um aspecto importante a considerar é que o uso de biocombustíveis visa preservar a atual estrutura de fabricação e uso de motores, no aguardo de um novo paradigma tecnológico, tipo células de combustível, expansão do uso da eletricidade, biohidrogênio ou outra inovação tecnológica revolucionária. Portanto, os biocombustíveis representam uma evolução e uma transição, em que são preservadas as tecnologias motrizes, migrando os combustíveis para produtos em linha com as demandas da sociedade.   Neste particular, é importante que o biocombustível que se propõe introduzir em substituição a um paradigma consolidado, atenda determinadas especificações, de maneira que o estoque de motores existentes – e os novos que venham a ser colocados no mercado – operem indiferentemente com o combustível anterior ou com misturas do novo combustível. Trata-se de uma tripla garantia: ao consumidor (mantém o padrão de desempenho já conhecido), ao fabricante (não altera a ferramentaria, linha de produção, peças ou garantias e não causa danos à imagem e à marca) e ao sistema produtivo (continuidade do desempenho da frota em relação ao sistema anterior).

As primeiras tentativas de introdução do biodiesel na matriz energética sempre foram precedidas de testes e ensaios para verificar o desempenho global do motor, a sua durabilidade e necessidade de manutenção, em função da mudança da composição do combustível. Como regra geral, a literatura registra que, biodiesel que atende os quesitos de qualidade e as especificações estabelecidas, conduzem a resultados similares àqueles obtidos com o uso de diesel de petróleo – atendidos os mesmos requisitos de qualidade e atendimento às especificações.  

Entretanto, este tema é tão sensível e envolve interesses e volumes financeiros de tamanha monta, que não basta revisar a literatura e concluir que, em outros países, diversos grupos de cientistas chegaram às conclusões acima. É necessário replicar e validar estes resultados para as condições locais e demonstrar a sua repetibilidade. No caso do Brasil, havia duas razões adicionais a estas para a realização dos testes: a especificação do biodiesel no Brasil é diferente da européia; na Europa (onde a maioria dos testes foram realizados), o biodiesel é produzido em sua quase totalidade a partir de canola. No Brasil, embora a concentração em óleo de soja e algodão e em sebo bovino, existe um espectro mais amplo de matérias primas. Uma derivada desta última razão é a legislação brasileira que prevê incentivos ao uso dos óleos de mamona e de dendê, o que necessitava ser considerado.

Brasil

Entre as diferentes iniciativas deflagradas com a Lei 11097/05, inclui-se a criação da Rede Brasileira de Tecnologia de Biodiesel (RBTB). Entre outras iniciativas meritórias, a RBTB conduziu um programa de Testes e Ensaios em Motores e Veículos, iniciado em 2004. O Programa foi coordenado pelo MCT, com a participação do MME, MDIC e da ANP e executado por uma rede de atores públicos e privados. A Comissão Técnica, coordenada pelo MCT, reuniu representantes da Anfavea, Sindipeças, Tecpar, IPT, Petrobrás/Cenpes, MME, MDIC, IBAMA e ANP, sendo sua responsabilidade o planejamento, monitoramento e avaliação dos resultados de todos os testes e ensaios.  

O Programa objetivou a realização de testes e ensaios em motores para a validação do uso da mistura B5, em conjunto com os fabricantes de veículos e peças, com vistas a assegurar ao consumidor final a manutenção da garantia de veículos e equipamentos, conforme dispunha a meta final da legislação brasileira. Entretanto, a avaliação do uso de outros percentuais (Ex.: B10, B20, B50, B100) é importante também para o uso em frotas cativas e para subsidiar decisões referentes à ampliação do uso do biodiesel no país.

  Durante o III Congresso da Rede Brasileira de Tecnologia de Biodiesel, realizado em novembro de 2009, foram apresentados os resultados finais e as conclusões dos 5 anos de trabalho, que envolveu centenas de professores, pesquisadores e engenheiros de 31 instituições públicas e privadas (fabricantes de veículos e de partes e peças, órgãos ambientais, universidades, institutos de pesquisas, produtores de biodiesel, laboratórios, distribuidoras de combustível, frotistas, concessionários, mecânicos e motoristas). Além de ser um trabalho de fôlego, exaustivo, seus resultados demonstraram a excelência e a qualidade dos ensaios e testes e a criteriosa observação de preceitos científicos, o que qualifica o estudo como um case de relevância mundial, fundamentando e consolidando premissas estabelecidas para o programa brasileiro de biodiesel.

Conclusões

Os resultados foram apresentados na forma de um livro com 175 páginas, onde são relatados, em pormenores a metodologia, as condições e os resultados dos testes efetuados, abrigando uma diversidade de motores, de ambiente e de procedência do biodiesel. Recomendamos entusiasticamente a leitura integral do documento a todos os interessados. Neste artigo, por restrição de espaço, nos cingiremos às conclusões do trabalho.

1. Qualidade dos combustíveis:

Pontualmente foram observadas ocorrências de não conformidade do produto B100 em relação às resoluções da ANP 42/04 e 07/08, destacando-se o teor de água e a estabilidade à oxidação do biodiesel derivado de óleo de soja. O biodiesel de óleo de mamona apresentou casos de alta viscosidade. Entretanto, os problemas verificados não foram considerados críticos e não houve necessidade de intervenção. Ressalte-se que todos os lotes de biodiesel (soja ou mamona) e diesel (metropolitano ou interior), utilizados nos testes, atenderam as especificações ANP 310/01 e 15/05;

 

A equipe do estudo chama a atenção para a importância do item contaminação total (ANP 07/08) como importante parâmetro para garantir a ausência de compostos que possam causar entupimento de filtros de combustível;

Ao final dos testes, a qualidade do óleo lubrificante dos motores operando com misturas diesel/biodiesel manteve-se com características físico-químicas semelhantes ao do óleo lubrificante dos motores que operaram com óleo diesel, mantendo-se dentro das especificações dos fabricantes;

Em decorrência do observado em (b), foram mantidos os intervalos de trocas de óleo prescritos pelos fabricantes.

2. Desempenho dos motores e veículos

As curvas de torque e de potência dos motores que utilizaram as misturas B5 ficaram dentro dos limites especificados pelos fabricantes. As eventuais diferenças observadas situaram-se dentro da faixa de variação do projeto dos motores;

O consumo de combustível dos motores operando com B5 foi ligeiramente superior ao de óleo diesel, em virtude do seu menor conteúdo energético e das características de combustão;

 

Os testes com dinamômetro e em campo não apontaram falhas relacionadas ao uso de B5, donde se conclui que não há restrição quanto ao uso dessa mistura em motores novos ou usados e independentemente do fabricante;

A dirigibilidade e o desempenho percebido pelos condutores foram considerados normais em todos os testes, não tendo sido notada qualquer diferença mencionada pelos condutores.

3. Efeito em motores, seus sistemas e componentes

Os componentes dos motores apresentaram-se em bom estado, no final dos testes, sem formação de borra, carvão e verniz;

Os elastômeros presentes nos motores e seus sistemas tiveram comportamento normal, sem ressecamento ou deformação com o uso de misturas B5;

As análises dos componentes móveis internos dos motores indicam que o nível de desgaste foi aceitável pela quilometragem percorrida pelos motores. Observou-se um pequeno desgaste das faces dos anéis e dos cilindros dos motores que usaram B5, porém a diferença observada para os motores que usaram diesel é muito pequena e não houve risco de falha dos componentes;

 

Os sistemas de injeção de combustível dos motores que operaram com B5 não apresentaram diferenças nas avaliações funcionais e de durabilidade, não sendo verificado ataque químico sobre os componentes do sistema;

O sistema de filtragem de combustível apresentou a mesma eficiência e desempenho com B5 ou diesel puro, não sendo evidenciada a presença de borras no elemento filtrante, ou alterações na sua estrutura, mesmo operando com pressão mais elevada, observada com B5 de mamona, comparativamente a B5 de soja ou diesel.

4. Emissão de poluentes

Para as misturas B5, em bancada dinamométrica, os resultados médios indicaram redução de emissão de CO (7%), HC (5%), MP (10%) e acréscimo de 4% no NOx;

As emissões de NOx, CO e HC mantiveram-se dentro dos limites especificados para cada tipo de motor, com todos os combustíveis testados, no início e final dos testes;

O índice de opacidade situou-se dentro dos limites homologados na certificação dos motores;

 

Não foi observada diferença significativa nas emissões, em bancada dinamométrica, por motores operando com biodiesel metílico ou etílico;

Para misturas acima de 5%, os testes de emissões operados com biodiesel de soja e mamona, de acordo com o ensaio em bancada dinamométrica, mostraram uma tendência de aumento nas emissões específicas de NOx e redução das emissões de CO, HC e MP, em relação ao óleo diesel.

Resumindo as conclusões do estudo, verifica-se que o mesmo corrobora resultados anteriormente citados na literatura, obtidos sob condições de ensaio semelhantes ou diferentes das utilizadas no presente estudo e demonstra a factibilidade do uso da mistura B5 nas condições brasileiras.

Biodiesel: as tensões comerciais das exportações americanas
Décio Luiz Gazzoni

Progressivamente o biodiesel constrói o caminho para tornar-se uma commodity global. Esta construção decorre da pressão social por mudanças na matriz energética, pleiteando maior participação de energia renovável; das políticas públicas de suporte à energia renovável, entre elas o biodiesel; das inovações tecnológicas que viabilizam a produção em larga escala de um produto de qualidade, a custos decrescentes; e da atuação empresarial, atendendo a demanda das políticas públicas e do mercado livre e organizando os canais e parâmetros de comercialização.

  Sob a égide de políticas públicas, mandatos de mistura de biocombustíveis em combustíveis veículares foram implantados em pelo menos 41 estados / províncias e em 24 países a nível nacional, até 2009. Como regra geral, os mandatos exigem misturas de 10-15 por cento de etanol com gasolina ou mistura de 2-5 por cento de biodiesel ao diesel. Os mandatos podem ser encontrada em pelo menos 13 estados indianos, nove províncias chinesas, 9 estados dos EUA, cinco províncias canadenses, dois estados australianos, e pelo menos 14 países em desenvolvimento, em nível nacional. Muitos países, incluindo vários estados dos EUA, também estão criando um mandato de utilização dos biocombustíveis nos veículos governamentais.   Tanto a capacidade de produção quanto a demanda nos mercados internacionais têm flutuado, e muitos países estão à procura de fornecedores para atender os mercados criados pelas políticas públicas. Do ponto de vista conceitual, o aumento do comércio de biodiesel beneficiará todas as partes envolvidas, diminuindo déficits comerciais, trazendo a segurança de oferta do combustível, redução das emissões de gases de efeito estufa e redução da dependência do petróleo – em especial se o país comprador não for produtor de petróleo.

 

Entretanto, em um mercado que ainda busca se organizar, problemas acontecem. Um deles, que pode acarretar consequências a longo prazo, é a controvérsia chamada de "splash and dash", em que o biodiesel subsidiado norteamericano foi exportado para a Europa, utilizando uma brecha na legislação americana, criando atritos comerciais na Europa e consternação no EUA. A Organização Mundial do Comércio estabeleceu diretrizes estritas de intercâmbio comercial, mas denúncias de comércio desleal continuam a surgir, exigindo aperfeiçoamentos constantes nas regras comerciais. Este assunto é tratado em pormenores no Box abaixo.   Após a crise, particularmente neste ano de 2010, a comercialização do biodiesel se encontra em turbulencia. Nos EUA, as indefinições legais acerca do incentivo fiscal são potencializadas pela demanda mundial por biodiesel, que deverá crescer exponencialmente para 7,8 bilhões de galões até 2015, de acordo com o DOE ( Agencia de Informação de Energia dos EUA). Este aumento na demanda reflete o aumento do consumo; mais consumo se traduz em aumento das oportunidades de comércio internacional, perturbando as políticas públicas que apontam para o abastecimento interno. Este turbilhonamento gera tensões comerciais que necessitam ser convenientemente administradas, para que todas as partes possam efetivamente beneficiar-se.

A tensão

Apesar do fechamento da brecha "splash-and dash", por disposições contidas no Emergency Economic Stabilization Act de 2008, a União Europeia continua empenhada em manter um olhar atento sobre as importações de biodiesel. Em agosto passado, a Comissão Europeia (CE), iniciou um inquérito anti-evasão, direcionado às importações de biodiesel norte-americano, para determinar se as medidas anti-dumping, impostas anteriormente, estão sendo violadas.

 

O Conselho Europeu de Biodiesel (EBB), que reúne produtores de biodiesel que representam 80% da produção do bloco, alega que, desde que a UE instituiu um direito anti-dumping e anti-subvenções contra as importações de biodiesel dos EUA, em junho de 2008 (as quais se estendem por cinco anos), surgiram fórmulas para tentar contornar as penalidades.

  A EBB afirma que o biodiesel norte-americano está sendo enviado para a UE através de outros países, principalmente o Canadá e Cingapura, a fim de dissimular a sua origem. O EBB também afirma que um importante volume de biodiesel produzido nos Estados Unidos continua a inundar os portos europeus, sob a forma de misturas B19, que não foram afetadas pelas regras da UE, denunciando que esta é uma mera tentativa de contornar as medidas anti-dumping e de compensação.

 

Já o Conselho Nacional de Biodiesel (NBB), que representa os produtores dos EUA, nega as acusações feitas pela EBB e afirma que pretende atuar na defesa dos seus membros. Além do NBB, o Departamento de Comércio dos Estados Unidos (USTR) emitiu uma refutação semelhante. Estas duas declarações, frente à atitude européia, dão uma dimensão das tensões UE/EUA.   A ação anti-evasão lançada pela CE é suportado por uma investigação paralela pela Luta Anti-Fraude da União Europeia (OLAF) que objetiva eliminar práticas comerciais inaceitáveis, que podem representar mais de €100 milhões (US$129 milhões) de direitos de importação, de acordo com o EBB. Caso as práticas taxadas de fraudulentas persistam, direitos não pagos podem ser cobrados pelas autoridades da UE com retroatividade de até três anos, além de outras pesadas sanções.

Laranjas?

Em março, a EBB relatou que as autoridades aduaneiras italianas apreenderam 10 mil toneladas de biodiesel nos portos de Veneza e Trieste. O produto foi declarado como tendo origem canadense, mas o EBB afirmou haver fortes evidências de que o produto tinha origem nos EUA O produto foi oferecido com um desconto de US$ 150 a US$ 180 por tonelada, comparativamente ao preço médio de mercado de biodiesel europeu de qualidade similar.   Sintomaticamente, as exportações canadenses de biodiesel para a UE aumentaram para mais de 140.000 toneladas em 2009, partindo de 1.700 toneladas em 2008, de acordo com a base de dados europeia de estatísticas, Eurostat – um aumento superior a 8.000%!.   Com um olho nas importações dos EUA, a UE também está preocupada com o forte incremento nas exportações de biodiesel da Argentina para a Europa, que aumentou drasticamente a partir de cerca de 5.000 toneladas em julho de 2008 para quase 100 mil toneladas por mês em julho de 2009. A EBB afirma que particularmente a indústria de biodiesel da Espanha tem sido duramente atingida pelas importações da Argentina.

A Argentina, um exportador líquido de biodiesel, aplica um imposto de exportação diferencial ao biodiesel produzido com óleo de soja. O diferencial entre o imposto de exportação, de 32 por cento de óleo de soja e os 20 por cento sobre o biodiesel, cria um incentivo financeiro para processar o óleo de soja em biodiesel.

  Este benefício comercial da Argentina está em vigor até o final de 2011, mas pode ser contestado pela UE se houver uma indicação de que a Argentina está em conluio com os EUA, vendendo biodiesel norte-americano para a Europa, como se fosse produzido na Argentina.

 

Austrália

Em junho, os serviços aduaneiros da Austrália (Border Protection Service) também iniciaram um processo de averiguação de dumping referente à importação de biodiesel dos EUA, especificamente B99 e misturas de biodiesel superior a 20 por cento, entre abril de 2009 a março de 2010. Caso a denúncia seja comprovada como verdadeira, todas as partes envolvidas na prática serão forçadas a cessar as transações comerciais e serão punidas com sanções e multas.

  A investigação veio à luz a partir de uma denúncia apresentada pela empresa australiana Biodiesel Producers Ltd. às autoridades aduaneiras locais, depois que percebeu aumento do volume de biodiesel norte-americano sendo vendido com um desconto sobre o biodiesel australiano, fazendo com que vários produtores locais perdessem market share. Segundo a Associação de Biocombustíveis da Austrália, o país abriga atualmente sete usinas de biodiesel, que operam principalmente com sebo e óleo de cozinha usado.

 

A alegação da Biofuels Association of Australia (BAA) é que o biodiesel norteamericano chegaria ao mercado australiano a preços inferiores ao custo da matéria prima usada pelos produtores locais de biodiesel. Outra queixa da BAA é que o produto norteamericano tem índice de cetano mais baixo do que a especificação australiana.   Ao invés de um esquema de subsídios praticados nos EUA, a Austrália se vale de um sistema complexo de concessão de incentivos à produção de biodiesel. O incentivo, referido como Cleaner Fuels Grant, é um benefício fiscal para produtores no valor aproximado de 35 centavos por litro, e vale até 01 de julho do próximo ano.  

As exportações diretas de biodiesel dos EUA para a Austrália têm sido de pouca monta neste ano e o país não se constitui em um mercado importante para os fornecedores dos EUA. Um relatório elaborado pelo USDA Agricultural Service, em julho passado aponta que as exportações de biodiesel dos EUA para a Austrália representam menos de 1 por cento do total das exportações americanas.

 

Box

O que é o "Splash and dash"

Uma política pública destinada exclusivamente a incentivar a produção e uso do biodiesel no mercado doméstico dos EUA, deixou uma lacuna que está causando atritos comerciais com a Europa e outros países. O Congresso dos EUA está revisando a provisão legal, para fechar a lacuna de uma vez por todas.

Em 2004, o Congresso aprovou uma disposição que prevê um crédito fiscal para o biodiesel que é misturado com o diesel comum. Esta disposição estava prevista para expirar em 2006, mas foi prorrogada até 2008, como parte do Energy Policy Act de 2005. O crédito fiscal federal equivale a 1 centavo de dólar a cada um porcento de biodiesel misturado ao diesel de petróleo. Assim, o B2 recebe um crédito de 2 centavos, enquanto o B99 recebe um crédito de 99 centavos de dólar. Ao final, esse crédito previsto para incentivar o crescimento do mercado doméstico nos Estados Unidos, acabou sendo aplicado a misturas de biodiesel exportado para outros países.

 

A União Europeia percebeu que o biodiesel por ela importado era uma mistura B99,9. Ou seja, cerca de 1.000 litros de óleo diesel foram adicionados a cada milhão de litros de biodiesel. Esse pequena "splash" de diesel de petróleo, se adicionado num porto dos EUA, a um tanque de biodiesel comprado da Malásia, iria se beneficiar do crédito fiscal dos EUA. Depois de obter o crédito, o petroleiro prossegue para a Europa e recebe os créditos do imposto europeu do combustível. Ao final, o biodiesel seria subsidiado tanto pelos contribuintes dos EUA quanto pelos europeus!

O Conselho Europeu de Biodiesel (EBB) fez uma queixa oficial em março, para Peter Mandelson, Comissário de Comércio da Comissão Europeia, pedindo que sejam tomadas medidas contra a importação do B99. A denúncia afirma que as importações B99 atingiram 30.000 toneladas por mês, em janeiro de 2007. De acordo com a denúncia, na maioria dos países da UE, as empresas associadas à EBB enfrentam a concorrência de dumping a partir de misturas B99, que são oferecidos no mercado como biodiesel puro, com um desconto significativo em alguns casos, passando de 100 a 150 euros por tonelada.

 

Biodiesel e as novas tecnologias
Décio Luiz Gazzoni

A Conferência Biodiesel BR 2010, realizada em São Paulo, no final de outubro, repetiu e amplificou o sucesso das anteriores, desta vez com o foco posto na construção do caminho para o B10. Factível ou não, visionário ou futurístico, este é um detalhe menor dentro do conjunto de ameaças e oportunidades para o setor. O aspecto verdadeiramente relevante é o consenso que foi observado entre os palestrantes de que a energia renovável ocupará, progressivamente, espaço cada vez maior na matriz energética brasileira, em especial na matriz de transporte. Portanto, caberá ao setor posicionar-se adequadamente, para capturar a parcela de mercado possível para o uso do biodiesel.   Durante o seminário coube-me analisar o impacto das novas tecnologias no mercado de biodiesel. Como outros conferencistas apresentaram e discutiram novas tecnologias destinadas, especificamente, a aprimorar a produção de biodiesel a partir de óleos vegetais, a minha preleção focou nas novas tecnologias de propulsão para serviços pesados, ou seja, novos processos e produtos que passam a disputar o mesmo espaço de mercado do biodiesel. Do resultado deste embate depende, em grande parte, o aplainamento do caminho para o B10 ou até além dele.   Dividi a apresentação em dois grandes segmentos. O curto e médio prazo será dominado por tecnologias similares às atuais, ou seja, mantém-se o motor de combustão interna de ciclo diesel e, consequentemente, os combustíveis líquidos. Para o médio e longo prazo, as células de combustíveis e os motores elétricos são promessas importantes, que merecem ser analisadas.

Cana-de-açúcar

1. Etanol.

Existem diversas tecnologias para uso de etanol como combustível em motores diesel. As mais conhecidas são a mistura álcool-diesel (conhecida como MAD-8) e a aditivação do etanol. A mistura MAD-8 (8% de etanol, 90% de diesel e 2% de biodiesel) teve seus testes interrompidos devido às mudanças na tecnologia de injeção nos motores, que inviabilizou a proposta.   A aditivação do etanol com um detonante (normalmente um produto nitrogenado) já foi estudada por diversos institutos e empresas no Brasil. Todos chegaram praticamente às mesmas conclusões quanto às vantagens (em especial a drástica redução nas emissões de GEE) e desvantagens (alto custo). No momento, a Universidade de São Paulo (USP), por meio do Cenbio (Centro Nacional de Referência em Biomassa) do Instituto de Eletrotécnica e Energia (IEE), participa do projeto BEST (BioEthanol for Sustainable Transport), suportado pela prefeitura de Estocolmo e sendo conduzido em diversas cidades do mundo (Estocolmo (Suécia), Madri e País Basco (Espanha), Roterdam (Holanda), La Spezia (Itália), Somerset (Inglaterra), Nanyang (China) e Dublin (Irlanda).

 

 

Figura 1. Foto do ônibus em teste no projeto BEST, em São Paulo.

O ônibus movido a etanol circula em São Paulo, como teste para demonstração de viabilidade, no corredor Jabaquara - São Matheus, com parada em nove terminais e atendimento a quatro municípios: São Paulo, Diadema, São Bernardo do Campo e Santo André. O veículo foi incorporado à frota da operadora Metra (Sistema Metropolitano de Transporte), indicada pela EMTU/SP (Empresa Metropolitana de Transportes Urbanos de São Paulo), e por mais uma operadora escolhida pela SPTrans (São Paulo Transporte), que gerencia o transporte de ônibus na capital paulista. No período de teste, o ônibus será comparado a outro do mesmo modelo a diesel. Aguarda-se a conclusão do projeto para avaliar a sua viabilidade comercial, em especial no cotejo de custos com outras alternativas de substituição do petrodiesel.  

Outra tecnologia que permite a substituição parcial do petrodiesel por etanol foi desenvolvida e testada em dinamômetro, sendo utilizada autalmente em um veículo de teste (Figura 2). Uma adaptação no motor original permite que seja substituído até 50% do petrodiesel por etanol, porém sem misturar os dois combustíveis, pois cada qual possui um sistema individualizado de alimentação e de injeção na câmara de combustão.

Os resultados disponíveis ainda são preliminares, entretanto indicam perspectivas animadoras para o desenvolvimento desta tecnologia, no tocante ao ganho de eficiência dos motores, à redução das emissões de GEE e à redução de custo de operação dos veículos ou motores estacionários.

Nos testes com dinamômetro, observou-se um aumento do rendimento térmico do motor (Figura 3) e melhoria da sua eficiência energética, medida em termos de demanda de unidades de energia contida no combustível para produzir determinada unidade de energia para uso no veículo (Figura 4).

 

Figura 2. Protótipo de veículo de teste da tecnologia de uso de etanol hidratado para substituição parcial de petrodiesel.

Figura 3. Rendimento térmico de um motor diesel operando com diferentes taxas de substituição de diesel por etanol, em diferentes rotações do motor.

Figura 4. Consumo energético de um motor diesel, operando com diferentes taxas de substituição de diesel por etanol, em diferentes rotações do motor.

Figura 5. Variação da emissão de gás carbônico em um motor diesel com diferentes taxas de substituição de diesel por etanol, em diferentes rotações do motor.

A Figura 5 mostra a redução das emissões de gás carbônico, conforme aumenta a proporção de etanol consumida pelo motor, sendo esta mais intensa na rotação mais alta (3000 rpm), que é o giro ideal de operação de um motor de ciclo diesel. A Figura 6 mostra a redução das emissões de óxidos de nitrogênio (NOx) que, ao contrário do CO2, se acentua nas baixas rotações. Entretanto, é forçoso salientar que, em qualquer rotação do motor é percebida uma redução das emissões, tendo em vista que o oposto ocorre com o uso de biodiesel. E a Figura 7 mostra uma redução linear de emissões de particulados, que pode atingir até 80%, comparativamente ao diesel puro, independentemente da rotação do motor.

Figura 6. Variação da emissão de óxidos de nitrogênio em um motor diesel com diferentes taxas de substituição de diesel por etanol, em diferentes rotações do motor.

Figura 7. Variação da emissão de material particulado em um motor diesel com diferentes taxas de substituição de diesel por etanol, em diferentes rotações do motor.

 

 

Um resumo dos resultados dos testes é apresentado a seguir.

Emissões de NOx – Redução de até 83%;

Emissões de particulados – Redução de até 81%;

Emissão de CO2 - Redução de até 18%;

Rendimento térmico do motor - Aumento de até 25%;

Temperatura do ar comprimido - Redução de até 74°C;

Intercooler – Dispensado;

Funcionamento do motor – Sem diferenças;

Consumo mássico de diesel - Reduções de até 60%;

Overdrive de potência - Potência até 30% superiores;

Óleo lubrificante do motor – Menor contaminação;

Custo de operação – Até 10% menor.

Baseado em um processo semelhante, a empresa Massey Ferguson produziu uma linha especial de tratores, que também permite a substituição parcial de petrodiesel por etanol, com significativos ganhos ambientais e financeiros (Figura 8).

 

 

Figura 8. Trator com motor de ciclo diesel movido a etanol em substituição parcial do petrodiesel.

Diesel vegetal

Diversas empresas de base biotecnológica, usando técnicas futurísticas de biologia sintética, engenheiraram fermentos e bactérias para produzir substâncias químicas customizadas, a partir da biomassa. Já existem processos que permitem produzir farneseno ou fanesano a partir de sacarose de cana. Estas substâncias fazem parte do complexo do petrodiesel, sendo reconhecidas pelo motor diesel sem necessidade de adaptação. Também foram desenvolvidos processos para obtenção de alcanos (hidrocarbonetos lineares com 12-16 átomos de carbono) a partir do desdobramento de celulose ou hemicelulose, presentes no bagaço ou na palhada de cana.   Veículos movido a diesel vegetal (caminhões e ônibus) estão sendo testados por uma montadora que, tendo em vista os ótimos resultados alcançados em seu campo de testes, expandiu a avaliação para ônibus comerciais que estão trafegando em linhas regulares em São Paulo. Um caminhão movido a diesel vegetal foi apresentado em recente feira do setor, realizada no Rio de Janeiro, com a presença de altas autoridades governamentais (Figura 9).

 

Figura 9. Veículo movido a diesel vegetal, apresentado em feira setorial no Rio de Janeiro.

Veículo movido a hidrogênio ou célula de combustível

Embora os custos desta tecnologia ainda sejam mais elevados que o uso do petrodiesel, pode-se afirmar que o futuro é visível, pois já existem protótipos de veículos para serviços pesados (transporte de passageiros ou de carga) operando com hidrogênio. A questão do alto custo é apenas mais um desafio para os cientistas, o que deve ser resolvido em um período razoável de tempo (não mais que 2 décadas), através de novos processos de obtenção de hidrogênio, inclusive o biohidrogênio, seja por fotossíntese artificial ou por degradação de matéria orgânica por meio de bactérias especializadas. Um destes veículos foi desenvolvido pela Universidade Federal do Rio de Janeiro e opera no transporte de passageiros do Campus da Ilha do Fundão (Figura 10). Na Figura 11 é apresentado um veículo misto, operando com célula de combustível e motor elétrico.

Figura 10. Ônibus movido a Hidrogênio, desenvolvido pela UFRJ.

 

Figura 11. Veículo híbrido operando com motor elétrico e célula de combustível.

Veículos elétricos

Veículos de carga ou de transporte de passageiros, movido a energia elétrica não representam novidades, pois a tecnologia existe desde o tempo dos bondes, passando pelos trams, troleibus e os modernos trens europeus. Estamos assistindo a um revival da tecnologia, em função da necessidade de despoluir as grandes metrópoles.  

Existe um limitador que é a necessidade de conexão permanente dos veículos com as linhas de eletricidade, que representa custo de instalação e manutenção, degradação da paisagem urbana e condicionamento do veículo à linha energizada. As tentativas de utilizar baterias para substituir a fiação elétrica esbarram na baixa autonomia das atuais baterias.

  O grande breaktrough tecnológico está na tecnologia denominada "Ultra Capacitor Zero Emissions Transit Bus", em que as baterias são substituídas por ultracapacitadores, com elevada capacidade de carga e tempo de recarga ultrarápido, com baixa latência (Figura 12). O veículo possui bateria de backup com autonomia de 80 km (ou seja, baixa autonomia). Entretanto, pode ser recarregado nas paradas de ônibus (5´ de carga = 2km), mesmo que o tempo de parada seja inferior a um minuto.

 

 

 

 

Figura 12. Ultra Capacitor Zero Emissions Transit Bus sendo recarregado em uma parada de ônibus.

Além disso, o veículo está equipado com um sistema que permite a recuperação de energia cinética nas frenagens, ou seja, ao invés de aplicar um atrito nas rotas (pastilhas ou lonas de freio), no momento da frenagem é aplicada uma carga representada por um gerador elétrico, que ao mesmo tempo em que diminui a velocidade do veículo, auxilia na recarga dos capacitores. Com este , em teoria o veículo pode rodar durante todo o dia, sem necessitar de fiação permanente.   As considerações sobre novas tecnologias não significam que devemos abdicar do sonho do B10. Minha intenção foi mostra que existem ameaças pelo caminho, que devem ser devidamente equacionadas através de ganhos tecnológicos, de eficiência de gestão e de políticas públicas, para atingir a meta a que o setor está se propondo.

 

Carvão e biomassa: biocombustíveis e sequestro de carbono

Décio Luiz Gazzoni

Em 22/11/10 um avião A320 da TAM voou durante 45 minutos no espaço aéreo do Rio de Janeiro, utilizando biocombustivel (bioquerosene) de pinhão manso. Este teste faz parte de um projeto para reduzir emissões de gás carbônico nos vôos da companhia, evitando multas que serão cobradas pela União Européia. A TAM calcula que teria de pagar entre 3 e 6 milhões de euros por ano por suas emissões em rotas para a Europa. Com a adição de bioquerosene, a redução da multa é proporcional ao porcentual do biocombustível.   O objetivo é obter a certificação de uma mistura de até 50% de bioquerosene com querosene de petróleo. No entanto, os altos custos de produção do biocombustível não permitem, no momento, o uso do porcentual máximo. A estratégia alternativa é acrescentar 1% no primeiro ano e ir crescendo à medida que o bioquerosene se tornar mais competitivo. A primeira batelada de bioquerosene produzida pela TAM foi feita com quatro toneladas de óleo de pinhão manso adquiridas junto a pequenos produtores e transformadas em bioquerosene nos Estados Unidos.

 O processo de produção do bioquerosene é muito similar ao do biodiesel, usando as mesmas matérias primas. Seria esta uma nova oportunidade para o setor de biodiesel? Vamos analisar a questão.

Novas tecnologias

Na coluna de novembro apresentei algumas tecnologias já em fase comercial ou pré-comercial, competidoras do biodiesel. Não comentei outras, por não se enquadrarem no critério de pré-comercial. Este é o caso de uma tecnologia em estudo pelo Departamento Nacional de Energia dos EUA, mais precisamente pelo Laboratório de Tecnologia da Energia (DOE / NETL), em parceria com a Força Aérea dos EUA (USAF) e entidades acadêmicas (Princeton, Case Western Reserve University, Pennsylvania State University e da University of Illinois at Chicago). O foco da pesquisa é a geração de combustíveis a partir da liquefação combinação de carvão mineral e biomassa, acoplando o sistema às tecnologias de seqüestro de carbono. O custo estimado da primeira fase da pesquisa é de US$7,5 milhões. O objetivo é o mesmo do teste da TAM: reduzir as emissões de gases de efeito estufa nas viagens aéreas.

  É uma linha de desenvolvimento totalmente inovativa embora os conceitos isolados (carvão + biomassa para líquidos (CBTL) e de captura e armazenamento de carbono (CCS) sejam muito conhecidos. A inovação é a junção CBTL+CCS. O processo CBTL consiste na produção de combustíveis sintéticos, obtidos a partir da gaseificação de matérias-primas orgânicas, usando o gás obtido (CO + H2) através da síntese de Fischer-Tropsch para produzir um combustível sintético ultra-limpo. Até aí nada de novo. Porém, durante o processo, o dióxido de carbono é capturado, para posterior armazenamento em formações geológicas, como poços de petróleo e gás esgotados ou aqüíferos salinos (Figura 1).   O CBTL + CCS é um primeiro passo da transição para o que os pesquisadores chamam de "Sistemas de Bioenergia com Armazenamento de Carbono" (BECS). Tais sistemas BECS resultam em combustíveis radicalmente carbono-negativos. Por exemplo, as energias renováveis mais conhecidas como eólica, solar ou hídrica fornecem energia carbono-neutro, ou seja, na melhor das hipóteses não contribuem para as emissões de gases de efeito estufa. Já os biocombustíveis carbono-negativo vão além, pois retiram da atmosfera o carbono fixado pela fotossíntese, estocando-o de forma inerte. É este conceito que está entusiasmando cientistas e formuladores de políticas públicas e que permite manter o fluxo de investimento na pesquisa.

 

Figura 1. Diagrama de blocos do processo CTBL + CCS

O principal foco do estudo é o combustível para aviação – aí a competição com o bioquerosene de óleos vegetais, testado pela TAM. As fontes alternativas de energia, se adequadamente concebidas, poderiam reduzir significativamente a quantidade de gases de efeito estufa liberados na obtenção e na queima de combustível de aviões a jato. Segundo o Departamento de Transportes dos EUA, a aviação é responsável por cerca de 10% das emissões de gases com efeito de estufa do setor de transportes nos EUA, ou cerca de 2,7% das emissões nacionais de GEE. Daí a importância de estudar, pontualmente, o suprimento de combustível para os aviões, pois para estes não é possível aplicar conceitos como a eletricidade, que deverá movimentar veículos de passeio e trens de carga, no médio prazo.

Solução de transição

As duas fontes, ou matérias primas, que são objeto da investigação (carvão e biomassa) – situam-se nos extremos do espectro do potencial de agressão ao ambiente e cada qual possui suas limitações. O carvão, uma fonte relativamente barata, abundante e prontamente disponível de energia, tem um perfil de emissões igual ou mais prejudicial que o petróleo. Já os biocombustíveis produzidos a partir de biomassa, representam uma alternativa atraente, porque o dióxido de carbono emitido a partir da sua combustão, será removido da atmosfera por uma nova geração de plantas, pelo processo de fotossíntese. Mas o potencial para produção de biomassa em larga escala nos EUA é limitada.   Como contornar a escassez e o alto custo da biomassa? Associando-a ao carvão. Como reduzir o impacto ambiental do carvão mineral? Associando-o com a biomassa e sequestrando o máximo de GEE durante o processo de produção de biocombustíveis. Esta é a justificativa principal desta linha de pesquisa. Assim, o processamento de carvão e de biomassa, em conjunto, para fazer combustíveis sintéticos, requer apenas metade da quantidade de biomassa, mantendo-se o conceito de produzir biocombustíveis com quase zero de emissões de gases de efeito estufa. Se a fração de biomassa é aumentada além de 50%, os combustíveis ultra-limpos se tornam carbono-negativos.   O sucesso dos esforços de pesquisa irá depender da comparação dos combustíveis sintéticos produzidos com esta técnica com fontes de energia tradicionais, em termos das características dos combustíveis, custos e questões ambientais e de segurança. E não há expectativa de solução a curto prazo, pela alta sensibilidade e pela necessidade de operar com riscos muito baixos, na aviação. Assim, é importante atentarmos para esta nova oportunidade de mercado, que não vinha sendo considerada até bem pouco tempo.

 

 

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